A Rússia iniciou, na madrugada desta quinta-feira,
24, uma invasão da Ucrânia, com ataques aéreos em todo o país, incluindo a
capital Kiev. Há ainda entrada de forças terrestres ao norte, leste e sul,
segundo os guardas de fronteira ucranianos, que registram suas primeiras
perdas.
A ofensiva provocou clamor internacional, ao qual
Moscou não deu ouvidos. Dois dias depois de reconhecer a independência dos
territórios separatistas ucranianos no Donbas, o presidente russo, Vladimir
Putin (que disse que queria "defendê-los" contra a agressão
ucraniana) lançou a invasão.
"Tomei a decisão de
uma operação militar", declarou Putin em um discurso na madrugada.
"Vamos nos esforçar para alcançar uma desmilitarizaração e uma
desnazificação da Ucrânia", afirmou. "Não temos nos nossos
planos uma ocupação dos territórios ucranianos, não pretendemos impor nada pela
força a ninguém", assegurou, apelando aos soldados ucranianos "a
deporem as armas".
Ele repetiu suas
acusações infundadas de um "genocídio" orquestrado pela Ucrânia nos
territórios separatistas pró-Rússia no leste do país e utilizou como argumento
o pedido de ajuda dos separatistas e a política agressiva da Otan em relação à
Rússia, da qual a Ucrânia seria uma ferramenta.
Explosões e mortes
Pouco depois começaram a
ser ouvidas explosões em várias cidades ucranianas, da capital, Kiev, a
Kharkov, a segunda cidade do país na fronteira com a Rússia, mas também em
Odessa e Mariupol, às margens do Mar Negro.
Sirenes de alerta para
bombardeios soam a cada 15 minutos em Lviv, a cidade para onde os Estados
Unidos e vários outros países transferiram suas embaixadas, e em Odessa.
O presidente ucraniano,
Volodymyr Zelensky, "ordenou infligir o máximo de baixas ao
agressor", indicou o comandante-em-chefe das Forças Armadas ucranianas, o
general Valery Zaluzni, assegurando que o Exército "reage com
dignidade" aos ataques inimigos.
Os guardas de fronteira
disseram que as forças terrestres russas entraram no território ucraniano pela
Rússia e Belarus, informando três mortes em suas fileiras. Já o exército
ucraniano afirma que
matou cerca de "50 ocupantes russos" na região de Lugansk (leste), nas primeiras horas
da invasão russa ao país.
No metrô de Kiev, dezenas
de pessoas tentavam se abrigar ou deixar a cidade, de trem ou por estrada.
"Acordei com o som de bombas, fiz as malas e fugi", contou à AFP
Maria Kachkoska, de 29 anos, agachada em estado de choque no metrô.
Mesmo quando ainda era
escuro, o trânsito era similar ao da hora do rush. Carros cheios de famílias
corriam para fora da cidade, para o oeste ou para áreas rurais, longe da
fronteira russa, a 400 km de distância.
Em Chuguev, perto de Kharkiv, uma mulher e seu filho
lamentavam a morte de um homem por um míssil, uma das primeiras vítimas desse
ataque. "Eu pedi que ele fosse embora", repetia o filho, ao lado de
um velho carro e da cratera deixada pelo projétil que caiu entre dois prédios
de cinco andares.
O exército russo
assegurou que visa apenas locais militares ucranianos com "armas de alta
precisão". E alegou ter destruído bases aéreas ucranianas e de defesa
antiaérea, enquanto Kiev declarou ter abatido cinco aviões russos e um
helicóptero.
O embaixador da Rússia na
ONU, Vassily Nebenzia, disse que seu país tem como alvo "a junta
governante em Kiev".
Em um vídeo postado no
Facebook, o presidente ucraniano declarou lei marcial em todo o país. "Não
entrem em pânico", "vamos vencer", disse.
A Ucrânia anunciou o
fechamento do seu espaço aéreo para a aviação civil. Os voos foram cancelados
nos aeroportos das principais cidades do sul da Rússia, perto da Ucrânia, e
Moscou fechou o Mar de Azov ao transporte.
Reação internacional
O ataque russo, após
meses de tensão e esforços diplomáticos para evitar uma guerra, provocou uma
torrente de condenação internacional. "Presidente Putin, em nome da
humanidade, leve suas tropas de volta à Rússia!", pediu o secretário-geral
da ONU, Antonio Guterres, visivelmente exausto, durante uma reunião de
emergência do Conselho de Segurança.
O presidente dos Estados
Unidos, Joe Biden, denunciou um "ataque injustificado". "O
presidente Putin escolheu uma guerra premeditada que trará perdas catastróficas
de vidas e sofrimento humano", afirmou em um comunicado. "Apenas
a Rússia é responsável pela morte e a destruição que este ataque
provocará", insistiu, depois de destacar que "o mundo fará com que a
Rússia preste contas". Ele também conversou com o presidente
ucraniano, prometendo seu apoio.
O presidente francês,
Emmanuel Macron, atual presidente do Conselho da União Europeia, pediu aos
europeus "unidade" e convocou um conselho de segurança no Palácio do
Eliseu.
"Os líderes russos
enfrentarão um isolamento sem precedentes", alertou Josep Borrell, chefe
da diplomacia da UE. Os 27 países da UE, que se reúnem em uma cúpula
excepcional nesta quinta-feira à noite em Bruxelas, preparam um novo conjunto de
sanções que serão "as mais severas já implementadas", acrescentou.
O secretário-geral da
Otan, Jens Stoltenberg, condenou um "ataque imprudente e não
provocado" da Rússia. Foi decidida uma reunião de emergência dos
embaixadores da Aliança Atlântica.
A China, com relações
estreitas com Moscou, disse estar acompanhando a situação "de perto"
e pediu "contenção de todas as partes", mas não condenou a Rússia.
Muitos temem que a crise
na Ucrânia possa levar ao conflito mais grave na Europa desde 1945. Uma
intervenção russa poderia resultar em "até cinco milhões de pessoas
deslocadas", alertou a embaixadora americana na ONU, Linda
Thomas-Greenfield.
Washington e seus aliados
ocidentais adotaram as primeiras sanções na terça-feira em resposta ao
reconhecimento dos separatistas do Donbas apoiados por Moscou, que Kiev vem
lutando há oito anos, um conflito que já matou mais de 14.000 pessoas até o
momento.
Os Estados Unidos devem
apresentar um projeto de resolução na mesa do Conselho de Segurança da ONU
condenando a Rússia por sua "guerra" na Ucrânia.
Impacto econômicos
Os mercados mundiais
foram imediatamente atingidos. Logo após o discurso de Putin, o petróleo subiu
acima de US$ 100 o barril pela primeira vez em mais de sete anos, e a Bolsa de
Valores de Hong Kong caiu mais de 3%.
Após uma interrupção, a
Bolsa de Moscou reabriu e operava em queda de quase 14%.
O POVO