O
início da vacinação no Brasil e em outros países não significa que as pessoas
devem retomar uma rotina semelhante à de antes da pandemia. A própria Organização
Mundial da Saúde (OMS) já indicou que a imunização de rebanho pela vacinação
não deverá ser atingida em 2021. A declaração foi feita este mês pela dra.
Soumya Swaminathan, da OMS.
“Mesmo
que as vacinas comecem a proteger os mais vulneráveis, não atingiremos nenhum
nível de imunidade na população ou imunidade de rebanho em 2021. Mesmo que
aconteça em alguns países, não vai proteger as pessoas ao redor do mundo”,
disse ela, em entrevista coletiva, no dia 11 de janeiro.
Soumya
elogiou o esforço dos cientistas na produção de não apenas uma, mas várias
vacinas contra a covid-19, algo que, na sua opinião, era impensado há um ano.
Ela acrescentou que as medidas de contenção da pandemia devem continuar sendo
praticadas até o fim deste ano, “pelo menos”.
Esse
raciocínio é acompanhado por especialistas aqui no Brasil. Segundo eles, a
população não pode relaxar porque a vacinação começou. “Quando observamos nossa
realidade no Brasil e as dificuldades que estamos tendo, a gente realmente
passa a pensar que isso [o fim da pandemia] vai ser talvez em 2022 e
olhe lá”, disse a médica infectologista e professora de
medicina Joana D'arc Gonçalves. “A gente está vendo a guerra que é
com essas poucas doses disponíveis no Brasil e nem temos a perspectiva
de ter mais doses, por causa de todos esses conflitos, as
dificuldades internacionais”, acrescentou.
Ela
lembra que as vacinas apresentam particularidades que, de uma forma ou de
outra, são entraves para sua distribuição. Seja uma necessidade de
armazenamento em temperaturas muito baixas, seja a dificuldade de produção de
insumos aqui no país. A médica recomenda que a população não veja a chegada da
vacina como algo muito próximo e mantenha os cuidados tomados em 2020.
“A
gente teve uma gota de esperança neste oceano de problemas. Temos que segurar a
nossa onda, saber que o insumo existe, mas que precisaremos de um pouco mais de
paciência. Não é tão fácil produzir rapidamente [uma vacina]”.
Vacinados e
com máscara
De
acordo com o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm),
Juarez Cunha, a imunização de rebanho só deverá ser alcançada se o mínimo de
60% da população estiver vacinada. Mas ele destaca que, mesmo que o
Programa Nacional de Imunização (PNI) do Sistema Único de Saúde (SUS) seja
sólido e consigamos vacinar parte da população brasileira até o fim do ano, o
vírus ainda estará em circulação. E faz um alerta: mesmo os vacinados devem
continuar adotando isolamento social, álcool em gel e máscara.
“Nenhuma
vacina é 100% eficaz. Com a vacina, a pessoa tem uma chance muito grande de se
proteger das formas moderadas e graves, mas não elimina a possibilidade de
contrair a doença. Estando com a doença, ela vai transmitir
para outros. Não dá para correr esse risco”.
Existe
ainda o componente social dessa medida. Se todas as pessoas vacinadas pararem
de usar máscara, isso pode, na visão de Cunha, desmobilizar a população como um
todo para o uso dessa barreira contra a covid-19. Veremos mais
pessoas sem máscara, estimuladas pelos vacinados. “E como as pessoas vão
saber se aquela pessoa já foi vacinada?”, questiona.
Além
disso, mesmo que parte da população do país se vacine ainda este ano, existirão
“bolsões de vulneráveis”. São comunidades, bairros ou grupos de
pessoas com poucos ou nenhum vacinado, onde haverá circulação do vírus.
Esse conceito pode ser reproduzido em escala mundial. Afinal, em um cenário
onde ainda há pouca vacina disponível, os países que saem na frente são os que
têm mais dinheiro para comprá-las mas, em algum momento, os demais
entrarão na partilha.
“Para termos
uma proteção coletiva, precisamos ter ótimas coberturas vacinais em
todos os países. Isso vai levar um tempo porque os países mais
pobres terão que receber muitas vacinas no momento em
que elas começarem a ser distribuídas para eles. Essas vacinas
vão demorar ainda mais, provavelmente começam a ser distribuídas no segundo
semestre”, analisou o presidente da SBIm.
Cunha
reiterou a importância dessas medidas “não farmacológicas”, como uso de
máscara, distanciamento social e higienização constante das mãos. Medidas
simples, mas eficientes, no combate ao novo coronavírus. “São as únicas medidas
que temos até agora que demonstram que diminuem a doença, a hospitalização e a
morte. Independentemente de começarmos a vacinar, de vacinar um percentual grande
da população, vamos ter que continuar com essas medidas por muito
tempo”.
Imunização
de Rebanho
Especialistas
estimam que para tirar um vírus de circulação, é necessário ter em
torno de 60% a 70% de pessoas vacinadas. “Depende da eficácia da
vacina”, diz Joana D'arc. “Quanto maior a eficácia, pode-se
até ter um número de imunizados menor que 70%”. Por
meio da vacinação em massa, o Brasil já conseguiu imunizar sua população contra
uma série de doenças perigosas.
Varíola,
sarampo, rubéola, caxumba e meningite são alguns dos casos. A poliomielite, que
ainda tem surtos em vários países, foi controlada no Brasil. No passado,
inúmeras crianças morreram de catapora, hoje controlada. “Teve país
que erradicou o câncer de colo de útero só por meio da vacina contra o HPV”,
destacou a infectologista.
Agência Brasil