Quase três
meses após a onda de protestos que tomou as ruas do país, o Brasil celebra
neste sábado o Dia da Independência com expectativa de novas manifestações em
centenas de cidades, que devem marcar as comemorações oficiais do 7 de
Setembro.
No Facebook, a convocação do grupo
Anonymous para o autodenominado "maior protesto da história do
Brasil" tinha mais de 400 mil confirmações para eventos em 149 cidades até
sexta-feira, ainda que isso não necessariamente reflita o número de pessoas que
estarão nas ruas.
Outros grupos, como o Grito dos
Excluídos e o Movimento Brasil Contra a Corrupção, também convocaram protestos
em quase todos os Estados.
As polícias das principais capitais
planejam aumentar seus efetivos nas ruas.
Brasília deve
ser um dos maiores focos de protesto, já que a capital federal terá também os
principais desfiles cívicos de 7 de Setembro - que devem ter duração menor
neste ano, sob justificativa oficial de que a umidade do ar está muito baixa -
e um amistoso de futebol entre Brasil e Austrália, no Estádio Mané Garrincha.
Edifícios
públicos, como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto, foram
protegidos por barreiras. O Congresso fechará às portas, suspenderá as visitas
de turistas e reforçará a segurança no seu entorno.
A Secretaria
de Segurança Pública do Distrito Federal diz esperar cerca de 150 mil pessoas
nas ruas - entre manifestantes, torcedores e espectadores dos desfiles - e
colocará 4 mil policiais extras nas ruas. As Forças Armadas também farão a
patrulha do desfile cívico, informou o Ministério da Defesa à Agência Brasil.
O uso de máscaras também promete
ser um dos pontos polêmicos durante as manifestações. Diferentes Estados
criaram regras distintas sobre o assunto. No Distrito Federal, manifestantes
mascarados que não quiserem se identificar serão detidos. Pernambuco também
proibiu que os manifestantes cubram o rosto. Já em São Paulo, o governador
Geraldo Alckmin disse que não há orientação nenhuma à Polícia Militar para
abordar pessoas com máscaras.
"Não tem
nada que proíba o fato de a pessoa estar usando máscara ou não estar usando
máscara. O que não pode é a depredação do patrimônio público ou privado",
disse o governador na sexta-feira.
No Rio de
Janeiro, o governo voltou atrás e decidiu permitir o uso de máscaras, mas os
policiais fluminenses poderão pedir às pessoas que descubram o rosto e se
identifiquem.
Participação popular
Em sua página
de convocação no Facebook, o grupo Anonymous disse que as reivindicações dos
protestos foram "escolhidas em votação pública e aberta" e incluem a
prisão dos réus do mensalão, a aprovação de projeto de lei de combate à
corrupção e uma reforma tributária, entre outros.
Pelo Brasil,
as bandeiras dos manifestantes incluem reforma política, boicote à Copa do
Mundo e melhorias nos serviços públicos.
O clima maior
de insatisfação deste ano deve engrossar protestos já tradicionais, como o do
Grito dos Excluídos, movimento que desde 1995 realiza manifestações na semana
de 7 de setembro.
"Esperamos
um número muito maior de pessoas", diz à BBC Brasil José Carlos Alves
Pereira, membro da coordenação nacional da Pastoral dos Migrantes/Grito dos
Excluídos Nacional. "Há um significado maior, (com reivindicações) por
mais formas de participação popular."
A percepção,
diz Alves Pereira, é de que, ainda que questões como o preço das passagens do
transporte público - tema central dos protestos anteriores - tenham sido
atendidas, "há coisas que não foram mexidas (pelo poder público) porque
não mudam do dia para a noite, e precisamos de um período maior de
manifestações".
Na opinião do
cientista político Paulo Baía, da UFRJ, que tem acompanhado a onda de
protestos, as manifestações deste sábado não devem levar às ruas um número tão
grande de pessoas quanto levaram em junho, mas contarão com o apoio da maioria
das pessoas em casa.
"As
pessoas estão com medo da polícia e dos manifestantes que agem com violência. E
não há um catalisador que estimule sua ida às ruas (como foi o aumento do preço
das passagens)", diz Baía à BBC Brasil. "Mas há um sentimento entre a
população de querer ser mais bem tratada, respeitada pelas instituições e
participar dos processos decisórios."
Temores de violência
Possíveis
cenas de violência nas manifestações, tanto por parte das forças de segurança
como de manifestantes, também geraram debate ao longo da semana.
A página do Black Bloc Brasil no
Facebook convoca para um "badernaço em todos os Estados" neste 7 de
setembro. O subtítulo do evento diz: "sem violência é o c*****o".
Na página, a organização diz que não é
"um grupo ou movimento" e defende "uma estratégia de
manifestação e protesto anarquista, na qual grupos de afinidade mascarados e
vestidos de negro se reúnam com objetivo de protestar em manifestações
antiglobalização e/ou anticapitalistas".
Alves Pereira,
da Pastoral dos Migrantes, diz que há uma preocupação no movimento do Grito dos
Excluídos para evitar que os protestos ganhem um caráter violento. "Nossa
tradição é de reivindicar direitos sem violência. A orientação é de não entrar
em conflitos, mas também não se misturar (a atos de violência)."
Reforço policial
No Rio, onde a
polícia foi autorizada a deter manifestantes com o rosto coberto até que estes
sejam identificados, artistas e intelectuais levaram uma carta ao secretário de
Segurança, José Mariano Beltrame, pedindo moderação na ação policial durante os
protestos.
O cantor
Caetano Veloso disse à Agência Brasil que a carta a Beltrame faz um
"pedido pontual sobre a atuação da polícia, mas também gostaríamos de
pedir aos manifestantes que contribuíssem para que (os protestos) se deem em
paz".
O cantor
também divulgou foto sua com o rosto coberto, em solidariedade aos
manifestantes mascarados. "Em favor da paz, no dia 7 de setembro, todos
deveriam sair mascarados como no carnaval, respondendo à violência simbólica,
sem usar a violência. Proibir o uso de máscaras numa cidade como o Rio de
Janeiro é uma violência simbólica", escreveu Caetano.
A Secretaria de Segurança fluminense
disse por e-mail que "manifestantes mascarados serão obrigados a se
identificar, quando abordados" e que a Polícia Militar fará um esquema
especial de segurança, com 1,9 mil policiais, em locais não divulgados por "questões
de segurança".
Em São Paulo,
a PM diz que reforçará o policiamento no Anhembi (zona norte), onde haverá
desfiles cívicos, e em regiões nas quais espera-se grande concentração de
pessoas, como a Avenida Paulista, onde estão agendados protestos.
Segundo a
corporação, o público será revistado na entrada do Anhembi e será impedido de
entrar com bebidas alcóolicas, fogos de artifício, "papel em rolo de
qualquer espécie", como jornais e revistas, vasilhames como copos de vidro
e outros "materiais e objetos que possam causar ferimentos".
Em nota, a PM
paulista disse que "o direito de manifestação pacífica é previsto
constitucionalmente e a Polícia Militar estará presente para assegurá-lo. A
instituição estará preparada para coibir crimes e contravenções penais, se
houver".