Menos de um terço dos municípios
cearenses foram contemplados na primeira etapa do Programa Médicos Pelo Brasil,
lançado pelo Governo Federal para substituir o Mais Médicos. Embora tenha sido
criado ainda em 2019, no começo do mandato do presidente Jair Bolsonaro, o
projeto só saiu do papel, oficialmente, na última segunda-feira, 19, quando o
Ministério da Saúde confirmou a contratação de 529 profissionais. Destes, 59
serão direcionados para um total de 50 cidades cearenses.
Na prática, com o quantitativo de
médicos anunciado, o programa deve alcançar apenas 27,17% do território
estadual, percentual muito abaixo da cobertura do Mais Médicos, que em 2018,
antes da saída dos médicos cubanos do País, chegou a 169 dos 184 municípios
cearenses, correspondente a quase 92% da área total do Estado.
O Governo da ilha
caribenha decidiu chamar de volta seus profissionais em novembro de 2018, menos
de um mês após Bolsonaro vencer as eleições presidenciais. À época, o
Ministério cubano de Saúde Pública do país justificou ter tomado a decisão em
virtude de "declarações ameaçadoras e depreciativas" do presidente.
Na campanha, Bolsonaro afirmou em várias ocasiões que “expulsaria” os
profissionais cubanos do Brasil, caso fosse eleito.
Apesar da saída dos
médicos de Cuba, que representavam mais da metade dos profissionais atuantes no
Mais Médicos, o programa não foi extinto pelo governo Bolsonaro e ainda hoje
segue em operação. Mas, de acordo com o Ministério da Saúde, a ideia é que ele
deixe de existir gradativamente, à medida que haja a expansão do Médicos Pelo
Brasil.
O POVO perguntou à pasta
federal quantos e quais municípios cearenses ainda são atendidos pelo Mais
Médicos, mas não recebeu as informações até o fechamento desta matéria. Foram
realizadas oito ligações e enviados três e-mails.
Para o presidente da
Associação Cearense de Medicina de Família e Comunidade (ACeMFC), Roberto
Maranhão, o Médicos Pelo Brasil ainda não deu indicativos de que terá
capacidade de suprir a carência por atendimento médico no Ceará.
Na avaliação dele, o
programa ainda não pode ser considerado uma política de saúde pública
consolidada. “Esse projeto nasceu mesmo como uma promessa de campanha, que era
pra ter sido efetivada no começo do Governo, mas demorou esse tempo todo”,
disse.
Segundo o médico, o
Ministério da Saúde ainda não detalhou pontos importantes sobre o funcionamento
do novo programa.
“Se você for analisar os
materiais de publicações, não encontrará nenhuma informação concreta, exceto a
divisão dos municípios e a remuneração dos profissionais. Não diz, por exemplo,
como vai ser o processo de supervisão desses médicos, um ponto fundamental, que
afeta diretamente no atendimento à população”, pontuou.
Maranhão ainda acrescenta
que a nova aposta do Governo, embora tenha como referência o Mais Médicos,
pouco guarda semelhança com a estruturação do primeiro programa, lançado em
julho de 2013 durante o governo Dilma Rousseff.
“Existia um projeto, que
trabalhava a questão das residências, da formação médica no Brasil, e que havia
uma estratégia para prover os profissionais aos locais de forma emergencial”,
afirmou.
“Nos últimos anos, o que
a gente tem visto é um esvaziamento na atenção primária, especialmente nos
locais que antes estavam ocupados, em sua grande maioria por médicos cubanos”,
criticou o médico. Além de presidir a ACeMFC, ele também integra o Coletivo
Rebento, grupo que reúne cerca de 200 médicos cearenses engajados na defesa do
fortalecimento do Sistema Único de Saúde (Sus).
O POVO ainda questionou o
Ministério da Saúde sobre a cobertura do Mais Médicos Pelo Brasil no Ceará,
nesta primeira etapa, e perguntou se há previsão para a contratação de uma nova
leva de profissionais, mas ainda não recebeu respostas. Tão logo a demanda seja
respondida, a matéria será atualizada.
Promessa de expansão
No lançamento do Médicos
Pelo Brasil, o secretário de Atenção Primária à Saúde (Saps) do Ministério da
Saúde, Rafael Câmara, assegurou que, até o fim deste ano, cerca de 4,6 mil
profissionais estarão atuando no programa. Ele não informou, no entanto, qual o
cronograma previsto para as próximas etapas nem o quantitativo de médicos que
serão contratados para cada uma das 27 unidades da federação.
Nesta primeira fase, o
estado que recebeu maior número de profissionais foi a Bahia, com 68 médicos.
Na outra ponta, o Acre foi contemplado com apenas um.
A remuneração e os
requisitos são os principais pontos que diferenciam o Médicos Pelo Brasil do
Mais Médicos. No novo programa, o salário pode chegar a R$ 31 mil, enquanto
anteriormente o valor era de pouco mais de R$ 11 mil, uma espécie de incentivo
pago aos profissionais, que eram contratados como bolsistas.
Ao contrário do Mais
Médicos, o novo programa só aceita profissionais com registro ativo no Conselho
Regional de Medicina (CRM) do Brasil. A condição impede a contratação de
médicos estrangeiros, exceto aqueles aprovados no exame do Revalida.
Outra mudança é que para
ingressar no Médicos Pelo Brasil, os profissionais terão que participar de uma
formação obrigatória na área de Medicina da Família, nos dois primeiros anos de
contrato. Após a conclusão do período, terão direito a atuar mediante vínculo
celetista.
Segundo o Ministério da
Saúde, a nova estratégia visa a atender prioritariamente aos vazios
assistenciais — locais onde há pouco ou nenhum atendimento médico,
principalmente nos municípios com alta vulnerabilidade social. Já no Mais
Médicos, a oferta era para municípios de todos os perfis, inclusive, em grandes
centros urbanos.
A VOZ DE SANTA QUITÉRIA