Não
são apenas 11 anos que separam Ana Vitória Gadelha, de 21 anos, de Daiane
Souza, de 32 anos. As duas cearenses vivem realidades opostas quando o assunto
é emprego. Ana Vitória está empregada, enquanto Daiane vive de
"bicos", sem um trabalho formal. Mas as duas compartilham a mesma
opinião: a idade influencia na hora de conseguir um emprego.
O Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (Caged), do Ministério da
Economia, legitima o pensamento das duas jovens. Análise realizada
pelo Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares com as informações do levantamento
aponta que, dentre as 15 faixas de idade pesquisadas pelo Caged, apenas quatro
apresentaram saldos positivos de emprego no ano passado no Ceará.
Essas
quatro faixas etárias geraram juntas um saldo de quase 30 mil postos formais de
trabalho no Estado em 2019 - somente o intervalo de 15 a 24 anos concentra 27,9
mil dos empregos gerados. O mesmo não ocorre para os trabalhadores com idade a
partir de 30 anos. Nestas faixas, foram demitidas mais pessoas do que
contratadas.
Para
o professor do curso de Economia Ecológica da Universidade Federal do
Ceará (UFC) e doutor em Sociologia, Aécio Alves Oliveira,
esse movimento de contratação de mais jovens em detrimento de pessoas com
idades acima dos 30 anos é uma tendência mundial e não apenas no Ceará.
Oliveira
diz ainda que em época de recessão econômica a situação piora. "A lógica é
a mesma, seja na crise ou na prosperidade. Mas no momento de crise, essa lógica
aparece mais perversa", avalia.
O
professor também afirma que as perspectivas não são muito favoráveis. "As
tendências históricas do sistema capitalista apontam numa direção que não é
nada alvissareira. A tendência do sistema é a introdução de inovações
tecnológi-cas cada vez mais abrangentes. A tecnologia mais avançada vem para
facilitar a substituição de trabalhadores altamente qualificados e
especializados por trabalhadores menos qualificados".
Para
Mardônio Costa, analista de Mercado de Trabalho do Instituto de Desenvolvimento
do Trabalho (IDT), a contratação de profissionais mais
jovens está associada ao baixo nível de atividade econômica. "O emprego
com carteira assinada está praticamente estagnado, e isso está associado à
incerteza, ao baixo consumo, à lenta retomada, porque os jovens se sujeitam
mais facilmente a salários mais baixos".
Esse
comportamento, segundo Costa, acontece muitas vezes justamente pela falta de
conhecimento. "Você tem uma força de trabalho com menos experiência, menos
comprometimento da renda familiar, e muitos deles estão buscando a sua primeira
colocação no mercado. Nessa fase de experimentação, de uma maneira geral, os
jovens tendem a se sujeitar mais".
"Nunca
é tarde"
Para Daiane Souza, a jovem de 32 anos,
mãe de quatro filhos, nunca foi fácil conseguir oportunidades de trabalho.
"Eu já tenho uns três anos desempregada. Eu vivo de reciclagem e faço
faxina quando aparece, além de ter o meu benefício do Bolsa Família".
Ela conta que a renda
média mensal de pouco mais de R$ 200 não dá nem para alimentar os filhos
direito. "Eu não tenho nenhuma renda fixa. Na minha reciclagem, às vezes
eu tiro até R$ 60. Com o Bolsa Família, mais uns R$ 175. Para sobreviver numa
casa com cinco pessoas, contando comigo, fica difícil. Hoje em dia, as coisas
estão muito caras".
Apesar dos 32 anos de idade, Daiane
considera que o número tem influenciado na hora de conseguir um emprego.
"Às vezes a idade atrapalha sim. O povo está dando mais oportunidade para
os mais jovens, os jovens aprendizes. Quem tem uma idade mais avançada fica em
último lugar. Eu conheço pessoas da minha idade que também estão
desempregadas".
A jovem diz que não tem cursos de qualificação
profissional e que isso também interfere na momento das entrevistas. "Eu
não tive nenhum tipo de curso, porque a minha juventude já não foi tão fácil. A
minha mãe não tinha condições de pagar cursos. E hoje em dia tudo é pago".
Mesmo com as dificuldade, Daiane ainda
sonha poder fazer algum curso e encontrar um emprego que dê para sustentar os
filhos. "Eu sempre tive vontade de fazer Informática ou Engenharia. Acho
muito bonito quem é engenheiro. Eu acho que nunca é tarde para você realizar o
seu sonho".
Desde cedo
Ana
Vitória Gadelha trabalha desde os 15 anos de idade. "Comecei a
trabalhar como jovem aprendiz. Depois que passei na faculdade, decidi ir atrás
de emprego. Foi nessa época que eu procurei por todo canto. Fui ao Centro,
shoppings, deixei uns 100 currículos".
Ela já trabalhou em empresa de
tecnologia no Dragão do Mar e agora faz parte do time de um escritório de
coworking (compartilhado). "Na época que eu estava buscando trabalho, a
idade influenciou a minha contratação. Infelizmente, questão de idade
influencia muito no mercado de trabalho. Uma pessoa com 21 anos vai ter mais
facilidade do que uma pessoa com 40 anos, por exemplo", opina.
Formada em Gestão Ambiental, Vitória
atualmente atua no setor financeiro e na parte ambiental da empresa. "Eu
comecei na parte de atendimento ao cliente e na parte financeira. Acredito que
aqui eu tenho chance de aumentar de cargo. Tenho inclusive participado de
treinamentos".
Diario do Nordeste