Uma reportagem da Associated Press revelou que há dois
anos a Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional, USAID, criou um
“Twitter cubano” cuja intenção era a de propagar a insatisfação com o governo
local. Conhecido como ZunZuneo – para os cubanos, o som que faz o beija-flor –
o sistema de mensagens de texto poderia contornar a rigorosa regulamentação da
internet de Cuba.
A USAID é geralmente conhecida pela ajuda humanitária à
comunidade internacional e não por se envolver em missões secretas para
derrubar regimes. No entanto, o porta-voz Matt Herrick sustenta que esta ação
tinha objetivos humanitários. Ele disse à Associated Press:
“A USAID é uma agência de desenvolvimento e não de
inteligência, e nós trabalhamos em todo o mundo para ajudar as pessoas a
exercerem os seus direitos e liberdades fundamentais e dar-lhes acesso a
ferramentas para melhorar suas vidas e se conectar com o mundo exterior. O
governo tem tomado medidas para ser discreto em ambientes não- permissivos?
Claro. É assim que você proteger o público. Em ambientes hostis, muitas vezes
tomarmos medidas para proteger os parceiros com que estamos trabalhando. Isso
não é exclusivo de Cuba”.
Métodos sofisticados evitaram que o governo cubano detectasse
as origens americanas da rede social. A USAID utilizou empresas de fachada e
contas bancárias offshore nas Ilhas Cayman para cobrir suas trilhas. A fim de
parecer autêntica, a home page do ZunZuneo teve falsos anúncios em banners.
De posse de uma lista com centenas de milhões de números de
telefone fornecidas à USAID por um contato dentro da emissora de televisão
estatal Cubacel, a organização pôde enviar mensagens de texto inócuas sobre
temas como futebol. Os alvos eram os mais jovens. Cerca de 40 mil deles
tornaram-se adeptos.
Uma vez que havia seguidores “suficientes”, eles começam a
receber mensagens politicamente mais agressivas. Houve também um website para
que os internautas pudessem se inscrever, dar feedback e enviar suas próprias
mensagens de texto de graça.
A Associated Press relata que as pessoas gostaram do sistema.
Os estudantes de jornalismo da Universidade de Havana Saimi Reyes Carmona e
Ernesto Guerra Valdes se inscreveram. Guerra disse que era “maravilhoso” e
chamouo ZunZuneo de “a fada madrinha dos celulares”.
As mensagens foram armazenadas em servidores de dois países,
mas não nos Estados Unidos. Recrutaram-se “executivos insuspeitos que não
seriam avisados dos laços da empresa com o governo dos Estados Unidos” para
dirigir o projeto. A Creative Associates International, empresa sem fins
lucrativos com sede em Washington, e a Mobile Accord Inc, de Denver, estavam
envolvidas.
A missão tinha duplo objetivo. Observando o papel que o SMS e
o Twitter desempenharam nos levantes políticos nas Filipinas e no Irã, a USAID
viu no ZunZuneo uma ferramenta de política externa em seu arsenal. A AP obteve
documentos em que a USAID diz que queria “empurrar Cuba para um impasse por
meio de iniciativas temporárias e começar o processo de transição para a
mudança democrática.” O sistema de mensagens também coletou dados dos usuários
através de pesquisas.
Em um memorando da Mobile Accord Inc., os gerentes de
projetos reiteraram: “Não haverá absolutamente nenhuma menção aos Estados
Unidos ou sobre o envolvimento do governo. Isso é absolutamente crucial para o
sucesso da missão”.
A missão terminou em 2012 devido ao imenso custo. No entanto,
a legalidade é duvidosa. Uma operação secreta como esta precisaria de
autorização presidencial e notificação do Congresso. Não se sabe ainda se
sabemos se algum congressista ou mesmo o presidente estavam cientes da
operação.
O senador Patrick Leahy declarou: “Há o risco de que jovens
cubanos desavisados não tinham ideia de que esta era uma atividade financiada
pelo governo dos EUA. A natureza clandestina do programa não foi divulgada ao
subcomitê orçamentário e não teve nenhuma responsabilidade de supervisão. E há
o fato de que ele foi ativado logo a prisão em Cuba de Alan Gross, um
subcontratado da USAID que foi enviado à ilha para ajudar a proporcionar aos
cidadãos o acesso à Internet”.
Esse envolvimento dos Estados Unidos em Cuba parece um túnel
do tempo de volta à Guerra Fria. As relações tinham melhorado, especialmente
desde que Fidel Castro deixou o cargo e seu irmão Raul Castro assumiu. Reformas
econômicas baseados no mercado têm sido postas em prática e algumas proibições
de viagens foram suspensas em 2011 pela administração Obama.
Fonte: Diário do centro do Mundo.