Foram
2.200 redações, cerca de 1.900 páginas e 66.000 linhas. Essa foi a quantidade
lida em apenas 20 dias por duas professora de São Paulo contratadas pelo Inep
(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) para
corrigir redações do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) em 2012.
Segundo elas – que pediram à reportagem do R7 para não serem identificadas – o valor pago por cada redação foi de apenas R$ 1,90, quantia inferior à remuneração oficial divulgada pelo MEC (Ministério da Educação), que é de R$ 2,35 por texto.
Segundo elas – que pediram à reportagem do R7 para não serem identificadas – o valor pago por cada redação foi de apenas R$ 1,90, quantia inferior à remuneração oficial divulgada pelo MEC (Ministério da Educação), que é de R$ 2,35 por texto.
O R7 teve
acesso aos e-mails trocados entre as profissionais e a supervisão do Cespe
(Centro de Seleção e de Promoção de Eventos Universidade de Brasília), que
media as contratações de corretores para o MEC, que comprovam o valor de R$
1,90 por texto corrigido.
Além da remuneração baixa, a carga
de 2.200 redações em apenas 20 dias, uma média de 100 textos diários, é
apontada como extenuante por especialistas. Segundo o psicólogo Breno
Rosostolato, é impossível manter o mesmo rigor e atenção com uma carga de trabalho
tão grande em um pequeno espaço de tempo.
Esse seria um dos motivos pelo qual
redações tiraram nota máxima com erros graves de ortografia ou outras com
inserções de receita de miojo e o hino do Palmeiras conseguiram cerca de 50% da
nota máxima de 1.000 pontos.
— Não há vista que não fique cansada. Deveriam pensar em outra estratégia. Acho que a leitura deva ser muito por cima.
— Não há vista que não fique cansada. Deveriam pensar em outra estratégia. Acho que a leitura deva ser muito por cima.
A
professora de português do colégio SESI de São Bernardo do Campo, Raquel
Patricia Godoy Bember, afirma que é comum na profissão a correção de muitos
textos por dia.
—Já corrigi cerca de 96 textos em
6h, isso com muita frequência pode causar falta de atenção sim.
Outro lado
A reportagem do R7 procurou o Cespe
para esclarecer a diferença entre o valor recebido pelas professoras e o
divulgado oficialmente. O centro afirmou que o responsável pelos pagamentos é o
Inep.
O presidente do instituto, professor
Luiz Claudio Costa, confirmou o pagamento de R$ 2,35 por texto corrigido.
— O Inep conta com parceiros na
contratação de corretores. Acredito que essa diferença no valor esteja
relacionada aos impostos que incidem sobre o serviço, não sei dizer ao certo se
é INSS ou outra coisa.
Segundo as professoras entrevistadas
pelo R7, os corretores são selecionados pelo Inep por meio de indicação de
pedagogos ligados ao ministério. Eles recebem o contato do Cespe e corrigem as
redações em uma página privada na Internet. Segundo as corretoras, é comum a
página travar durante as correções.
Erros
O Inep afirma que as redações do
Enem podem receber nota máxima mesmo com erros de ortografia. O motivo da
tolerância, segundo o instituto, é que os erros não seriam relevantes do ponto
de vista pedagógico, porque os alunos do Ensino Médio ainda estariam “em
processo de letramento e transição para o nível superior”.
Para a mestre em Língua Portuguesa
Jussara Hoffmann, erros relacionados à gramática não podem ser aceitos, por não
serem critérios relativos, ou seja, que dependem da opinião do corretor.
— Existem aspectos subjetivos, que dependem de cada corretor, como a originalidade e clareza do texto. Mas concordância, ortografia e gramática são critérios objetivos e erros graves como os que aconteceram não podem passar desapercebidos.
— Existem aspectos subjetivos, que dependem de cada corretor, como a originalidade e clareza do texto. Mas concordância, ortografia e gramática são critérios objetivos e erros graves como os que aconteceram não podem passar desapercebidos.
Para a
especialista é necessária uma orientação mais clara para os corretores, com
treinamento e explicitação dos critérios de análise. Segundo ela, o ideal seria
a revisão do texto por no mínimo três examinadores.
Ela acredita que a seleção dos corretores precisa
ser mais rigorosa.
- Ser professor não garante que o
profissional tenha domínio absoluto da língua. Defendo uma prova para seleção
dos corretores, que hoje é feita por indicação.
Polêmicas
desde janeiro
A redação do Enem 2012 é alvo de
polêmicas desde o começo do ano. Diversos estudantes pediram revisão da nota. O
objetivo era conseguir uma classificação melhor antes do período de inscrições
do Sisu (Sistema de Seleção Unificada) entres os dias 7 a 11 de janeiro, que
utiliza o Enem como base para a oferta de vagas em diversas universidades
públicas.
As notas da prova e das redações já haviam saído em 8 de dezembro, mas muitos não concordaram com a avaliação, o que gerou protestos e abaixo-assinados em 11 cidades brasileiras.
As notas da prova e das redações já haviam saído em 8 de dezembro, mas muitos não concordaram com a avaliação, o que gerou protestos e abaixo-assinados em 11 cidades brasileiras.
A Justiça
Federal em Bagé, no Rio Grande do Sul, chegou a suspender o encerramento do
prazo do Sisu. O juiz federal Gustavo Chies Cignachi determinou, na época, que
o Inep divulgasse o resultado da prova e o espelho de correção da redação do
Enem a uma estudante, permitindo a utilização de recurso contra a nota obtida.
O MEC recorreu da decisão e ganhou a causa.
Por fim, em 6 de fevereiro, o
ministério divulgou as correções das 4.113.558 redações, das quais 1,82%
estavam em branco.
* colaborou a estagiária Jessica Rodrigues.