Atuação teve como foco ações de fiscalização na oferta da merenda escolar e no transporte de alunos da rede pública de ensino.
O Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE-CE) divulgou, neste mês de outubro, o resultado de ações de fiscalização em dez secretarias municipais de Educação do interior cearense. De acordo com o órgão de controle, elas foram realizadas no ano passado, motivaram determinações para solução das irregularidades constatadas e promoveram a devolução de um montante maior que R$ 400 mil aos cofres públicos.
Ao que informou o TCE, o somatório é o produto de dois meses de inspeções, realizadas entre julho e agosto do ano passado. Dos dez processos gerados pela operação, seis já foram julgados e com relação a um sétimo foi encaminhado.
"Além dos seis que já foram julgados, existe um sétimo (de Lavras da Mangabeira) que, embora o relator ainda não tenha julgado, ele já se antecipou e solicitou aos agentes que se manifestassem em aspectos de defesa", explicou Fausto Maia, chefe da Direção de Fiscalização de Atos de Gestão I, vinculada à Secretaria de Controle Externo do TCE Ceará.
Entre as gestões municipais com processos julgados aparecem:
l Missão Velha;
l Trairi;
l Moraújo;
l Maranguape;
l Maracanaú;
l Forquilha.
O processo envolvendo a prefeitura de Ipu foi comunicado ao Ministério Público para tomar providências. Os que têm as administrações de Jardim e Juazeiro do Norte como alvo ainda serão julgados.
IRREGULARIDADES ENCONTRADAS
Pelo que destacou Maia, a atividade seguiu um fluxo de rotina das equipes e teve como foco a merenda escolar e o transporte de estudantes da rede pública de ensino. "Fizemos as consultas das nossas matrizes de risco e esses (dez) municípios foram selecionados por volume de recurso e por outras questões", disse.
Assim foi composta a lista de irregularidades no contexto do transporte escolar, que inclui:
l A existência de veículos em situação irregular e com capacidade de condução reduzida;
l Condutores sem habilitação adequada e em situação de precarização trabalhista pelas empresas contratadas;
l Subcontratação total nos serviços;
E superfaturamento na aquisição de ônibus.
Já no que diz respeito à alimentação dos alunos, os achados do Tribunal de Contas apontam para:
l Divergências nos controles realizados sobre os estoques;
l Ausência de mapeamento de produtos da agricultura familiar para uso no cardápio das unidades escolares.
l Também foram observadas:
l Deficiências nos controles de saída;
l Distribuição e estoque do material didático e na gestão patrimonial de bens permanentes;
l Deficiência ou insuficiência de medidas para proteção dos dados pessoais tratados por meio do sistema de gestão educacional;
E equipamentos fora de operação por falta de providências de instalação.
RESULTADOS ALCANÇADOS
A relação de resultados alcançados, considerando os que já foram analisados pelos conselheiros, aponta ainda que houve a recomendação para aprimoramento das rotinas de fiscalização nos veículos e capacitação dos profissionais envolvidos no transporte escolar, para adoção de sistema informatizado de controle de estoque de merenda escolar, além de determinação para substituição de carros que tenham mais de 10 anos de uso.
Houve ainda a determinação para que se detalhe ou revise adequadamente os contratos de transporte escolar, para a repactuação de preços para eliminar superfaturamento de mais de R$ 120 mil mensais em contrato do serviço e para adoção de controles internos de modo que sejam pagos apenas os percursos efetivamente realizados.
Caso haja o descumprimento das determinações, os municípios envolvidos poderão ser multados ou serem incluídos em outros processos instaurados pelo próprio TCE.
Em outros casos, o Ministério Público poderá ser acionado. "Se tiver necessidade de apurar a responsabilidade, conduta, dano ou qualquer outro tipo de situação que tenha violado um aspecto legal de maneira mais grave, aí a gente instaura um processo de representação, para que o MP atue normalmente", completa o diretor de Fiscalização de Atos de Gestão do Tribunal de Contas.
RESPOSTA DAS PREFEITURAS
Contatamos as seis prefeituras que tiveram processos julgados através dos endereços eletrônicos disponibilizados por elas em seus canais oficiais, mas apenas três - o que representa metade delas - responderam às mensagens enviadas até a publicação desta matéria.
A primeira delas foi a Prefeitura de Maranguape, informando que "as impropriedades apontadas pelo TCE se resumiram apenas aos contratos de transporte escolar que haviam sido contratados pela gestão anterior". De acordo com o comunicado, os termos foram rescindidos pelo atual prefeito desde outubro de 2022.
Conforme alegaram, as irregularidades eram apenas "pequenas atecnias ou falhas meramente formais de execução". As situações teriam gerado recomendações do tribunal de contas, e foram seguidas pelos atuais ocupantes da administração municipal.
Marancanaú também retornou o contato. Através da sua Ouvidoria Geral, o Município disse que o processo julgado pela Corte de Contas resultou em uma determinação à Secretaria Municipal de Educação para que fosse apresentado, no prazo de até 60 dias, um cronograma de implementação das medidas a serem adotadas em relação ao controle dos estoques da merenda escolar.
O limite estabelecido pelo TCE irá se encerrar nesta quinta-feira, dia 19 de outubro. A Ouvidoria, subordinada à Secretaria de Governo, garantiu que está envidando esforços para cumprir o que foi decidido: "No momento, as providências estão sendo tomadas para que as respostas sejam enviadas dentro do prazo estabelecido".
A Prefeitura de Trairi esclareceu que os processos de inspeção identificaram apenas "inadequações", que seriam, de acordo com a própria administração, "passíveis de saneamento" por "meras determinações" ou recomendações.
Por meio de nota, ela apontou que foi determinado aos gestores a implementação de controles internos para a fiscalização e medição da execução dos percursos do transporte escolar para garantir a liquidação e pagamentos de acordo com o que foi efetivamente executado, a revisão contratual de algumas rotas, a devolução de eventuais pagamentos indevidos, a adequação de termos contratuais e normativas para a logística de estudantes, a atenção a contratos que englobem exigências como a posse dos veículos e questões de contratação de profissionais, a implementação de controles internos para comprovar o recolhimento de encargos trabalhistas e previdenciários, a ampliação de pesquisa de preço dos procedimentos licitatórios e o mapeamento de produtos da agricultura familiar antes da realização das chamadas públicas.
Para corrigir esses pontos, o Município alegou que houve uma modificação no modelo de aferição mensal do serviço, a correção dos contratos de prestação de serviço das rotas mencionadas pelo TCE, o envio de planilhas que comprovem que não houve pagamento indevido e documentos que comprovem a propriedade dos veículos, assim como a gestão se comprometeu a seguir as recomendações para as próximas contratações, dentre outros cuidados que a prefeitura garantiu seguir a partir do que foi julgado pelo Tribunal.
A Corte de Contas determinou também a promoção da recondução dos percentuais de despesa com pessoal ao limite legal previsto para que seja atendida a demanda por nutricionistas, tida como uma contrapartida pela participação no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Também foi recomendada a realização periódica de capacitação para a equipe de fiscalização do transporte escolar e a constante fiscalização dos veículos, sejam eles próprios ou privados.
O Executivo de Trairi disse que procurou o TCE para se certificar da demanda por profissionais da área de nutrição para que pudesse tomar providências que venham a atender esse requisito. Quanto à capacitação dos agentes de fiscalização, foi informado que a equipe que faz esse trabalho foi orientada sobre as exigências, de modo que a vistoria dos carros e dos percursos seja realizada trimestralmente.
ÓRGÃOS DE CONTROLE AJUDAM NA EFICIÊNCIA DAS GESTÕES
A reportagem consultou a professora Alessandra de Araújo Benevides, doutora em Economia, pesquisadora e co-fundadora do Laboratório de Análise de Dados e Economia da Educação (EducLab) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Ela explica que a atuação de qualquer agente público, como é o caso de prefeitos e prefeitas, precisa atender ao princípio da eficiência.
Cumprir tal fundamento significa, basicamente, prestar serviços, fazer mais e melhor com os mesmos recursos. "Uma eficiência dos gastos educacionais pode gerar melhores resultados nos indicadores, tanto de acessibilidade quanto de qualidade", disse a especialista ao se referir as duas obrigações que são da alçada dos quadros em questão.
A docente de Economia da UFC também esclareceu que uma boa gestão de recursos colabora diretamente no princípio da eficiência.
Para a estudiosa, a sociedade civil e os órgãos de controle - cada vez mais atuantes - agem de forma colaborativa entre si, facilitando uma fiscalização. "Os tribunais de conta têm melhorado bastante sua prestação de serviços e a própria transparência. Isso é importante, porque, se os órgãos que fazem esse controle externo da administração se tornam mais transparentes, eles também chamam a sociedade para esse controle externo. As vejo como benéficas", atribuiu.
Considerando sua trajetória como pesquisadora do assunto, Alessandra opinou ainda que, de fato, há um despreparo por parte de alguns entes públicos municipais para gerir os recursos, mas ponderou que esse tipo de discurso, apesar de frequente, vai se enfraquecendo à medida que os tribunais de contas têm amparado as gestões e que o acesso à informação tem se tornado mais fácil.
Fonte: Jornal Diário do Nordeste.