O líder sul-africano Nelson Mandela (1918-2013) disse, certa vez, que “democracia com fome, sem educação e saúde para a maioria, é uma concha vazia”.
Pois o Brasil, que ainda não erradicou o analfabetismo nem é capaz de garantir o acesso universal de sua população à saúde pública de qualidade, agora convive dramaticamente com a fome. Os números são estarrecedores.
Cerca de 33,1 milhões de brasileiros passam fome, segundo dados do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN).
Em comparação com 2020, praticamente dobrou o número de pessoas no País que não têm o que comer diariamente: são 14 milhões de cidadãos a mais nessa situação, em números absolutos.
O levantamento ainda mostrou que 125,2 milhões de brasileiros – o correspondente a mais da metade (58,7%) da população nacional – vivem com algum grau de insegurança alimentar. Problema gravíssimo que, em outras palavras, afeta seis em cada 10 habitantes de nosso país. Aumento de 60% em relação a 2018 e de 7,2% se comparado com 2020. O quadro é dramático.
A pesquisa desnudou a face mais cruel do empobrecimento dos brasileiros ao longo das últimas décadas. O que se vê, atualmente, é uma significativa parcela da população passando da pobreza para a miséria, sem renda suficiente para garantir pelo menos o alimento do dia a dia, absolutamente distanciada do mínimo de dignidade.
Por opções erradas de seus governantes, o País transformou-se numa imensa fábrica de pobreza. Uma das principais causas dessa situação é o verdadeiro manicômio tributário instalado no Brasil, com elevadíssima carga de tributos incidindo sobre produtos de consumo, em especial gêneros alimentícios, vestuário, limpeza e higiene pessoal. Enquanto as nações desenvolvidas optam por tributar a renda, o Brasil faz incidir mais tributos sobre o consumo. Basta dizer que do total da arrecadação tributária nacional, entre 41 e 44% advêm dessa política. Nos países de Primeiro Mundo, essa proporção fica entre 17 e 21%. Isto é: o Brasil está penalizando fortemente a população mais pobre.
O excesso de encargos sociais e previdenciários também tem papel relevante nesse cenário. Ajuda a compor o mapa da penúria. Para entender tal situação, mais um exemplo: em 2020, o total de impostos pagos pelo trabalhador brasileiro – aquele que tem a sorte de ainda estar empregado – correspondia à sua remuneração por 151 dias de trabalho.
Não se pode creditar à pandemia tal situação embora, de fato, a Covid-19 tenha contribuído para o atual estágio brasileiro. Esse imenso buraco no qual se meteu involuntariamente a população vem sendo cavado há muito tempo. É uma obra em permanente construção, fruto da irresponsabilidade dos governos que, em vez de atacar as causas da pobreza, vêm investindo em medidas meramente paliativas, socorros temporários quando o povo merece dignidade vitalícia.
Fonte: Pragmatismo Político.