Com
aval do presidente da República, Jair Bolsonaro, deputados federais rejeitaram
um veto do próprio chefe do Planalto para anular dívidas tributárias de igrejas
acumuladas após fiscalizações e multas aplicadas pela Receita Federal. Agora, a
votação depende do Senado, o que deve ocorrer ainda nesta quarta-feira, (17).
Conforme
o Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) revelou em
setembro, o valor do "perdão" seria de quase R$ 1 bilhão.
Documento
enviado pela liderança do governo aos parlamentares nesta semana estima a
renúncia tributária de R$ 1,4 bilhão nos próximos quatro anos. De estoque
acumulado em anos anteriores, deixariam de ser cobrados R$ 221,94 milhões.
A
proposta alvo do veto exclui as igrejas do rol de contribuintes da Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), ampliando o alcance da imunidade prevista
na Constituição. Além disso, perdoa as dívidas acumuladas com esse tributo no
passado.
Bolsonaro
vetou a medida com o argumento de que o dispositivo foi aprovado sem
compensação fiscal e a sanção poderia ser classificada como crime de
responsabilidade - dando margem para um processo de impeachment.
Mas,
por outro lado, se manifestou favorável à não tributação de templos e estimulou
a derrubada do próprio veto.
Como
mostrou o Broadcast, na época do veto, em reunião com o ministro da Economia,
Paulo Guedes, e o secretário especial da Receita Federal, José Barroso Tostes
Neto, Bolsonaro demonstrou receio em cometer crime de responsabilidade, embora
tenha dito que pessoalmente concordava com o perdão e quisesse sancionar a
medida.
Imunidade
constitucional contra a cobrança de impostos
As
igrejas têm imunidade constitucional contra a cobrança de impostos, mas a
proteção não alcança as contribuições, como a CSLL (sobre o lucro líquido) e a
previdenciária.
Nos
últimos anos, a Receita identificou manobras dos templos para distribuir lucros
e remuneração variável de acordo com o número de fiéis sem o devido pagamento
desses tributos - ou seja, burlando as normas tributárias.
A
medida aprovada pelo Congresso Nacional pretendia, por meio de uma lei
ordinária, estender a imunidade constitucional das igrejas à cobrança da CSLL e
ainda anular dívidas passadas.
Outro
dispositivo almejava anistiar multas e outras cobranças aplicadas sobre a
prebenda, como é chamada a remuneração dos pastores e líderes do ministério
religioso.
Ambos
os artigos foram propostos pelo deputado David Soares (DEM-SP), filho do
missionário R. R. Soares, fundador da Igreja Internacional da Graça de Deus,
que tem milhões em dívidas com a União.
Bolsonaro
vetou o primeiro dispositivo, que trata da CSLL, para afastar qualquer eventual
violação à Constituição. Mas o presidente sancionou o artigo sobre a prebenda,
de caráter mais interpretativo.
Após
estimativas iniciais apontarem o risco de desfalque de R$ 1 bilhão aos cofres
da União caso os dois artigos fossem sancionados, cálculos atualizados da área
econômica mostraram um prejuízo potencial de até R$ 2,9 bilhões.
Com
a sanção do artigo sobre a prebenda, o risco seria de R$ 1,1 bilhão. Mas a
avaliação na área econômica é que o dispositivo foi mal redigido e dá margem
para que a Receita Federal siga na briga pela cobrança dos débitos.
Isso
porque o projeto só interpretou uma norma vigente, que, segundo esses técnicos,
já era seguida à risca pelo Fisco.
A
percepção na área econômica é que os templos usarão a norma sancionada para
tentar reabrir a discussão jurídica, que hoje já está na fase de execução de
bens dessas igrejas, para tentar pleitear a anulação, mas não necessariamente
terão sucesso na disputa.
Para
evitar essa judicialização, a equipe econômica havia recomendado veto total às
medidas, mas precisou ir para a mesa de negociação diante do desejo do Palácio
do Planalto em fazer um aceno à bancada evangélica, que é um importante pilar
de sustentação do governo.
Bolsonaro
foi eleito com o apoio de diversas lideranças evangélicas. Embora se declare
católico, o presidente tem uma relação próxima a pastores e igrejas
evangélicas. A primeira-dama Michelle Bolsonaro é frequentadora da Igreja
Atitude, no Rio.
Três
integrantes do primeiro escalão do governo são pastores: a ministra Damares
Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e os ministros André Mendonça
(Justiça e Segurança Pública) e Milton Ribeiro (Educação).
A
bancada evangélica tem se articulado para incluir, na reforma tributária, a
ampliação do alcance de sua imunidade tributária para qualquer cobrança
incidente sobre propriedade, renda, bens, serviços, insumos, obras de arte e
até operações financeiras (como remessas ao exterior).
A
avaliação de tributaristas, no entanto, é que a medida não daria às igrejas
salvo-conduto para continuar driblando a fiscalização para distribuir lucros
disfarçados de renda isenta.
CNN