Ex-catador
de latinhas, o professor Ciswal Santos, de 31 anos, radicado em Juazeiro do
Norte, na região do Cariri do Ceará, acaba de desenvolver um computador do
tamanho de uma caixa de fósforo, para ampliar a acessibilidade tecnológica de
famílias de baixa renda. O aparelho, que foi construído com um custo de apenas
R$ 22, pretende auxiliar, sobretudo, crianças e jovens cearenses no ensino.
Em
2018, a história de Ciswal ganhou o Brasil após o professor ser selecionado para estudar na Universidade de Harvard, nos Estados
Unidos, uma das mais conceituadas do mundo. A seleção ocorreu a
partir de um projeto de sua autoria de geração de energia sustentável, captação
de água e acesso à internet por baixo custo. O trabalho já foi implementado em
uma aldeia de Moçambique, no continente africano, em janeiro deste ano.
Batizado
de HYTEC One (que significa “Oi, tecnologia” em inglês), o computador foi
criado com pequenos componentes eletrônicos, rodando um sistema operacional
básico, que pode ser conectado a qualquer tela, seja um monitor ou um celular.
A
ideia surgiu quando Ciswal começou a perceber a dificuldade de estudantes para
assistir a aulas escolares remotamente, principalmente durante a pandemia de
Covid-19, já que muitos não têm acesso à internet. “Um computador hoje é bem
caro. A falta de acessibilidade me deixava desconfortável desde cedo”,
justifica.
Quando ainda morava em sua terra natal, Palmares, em Pernambuco, Ciswal recorda que, aos 8 anos de idade, desejava muito fazer um curso de computação. “Pedi muito para meu pai, mas o valor do curso era a feira”, lembra. Sem dinheiro, sua família o colocou para estudar datilografia. “Quando estava terminando o HYTEC One, lembrei desse episódio. Se naquela época, um Ciswal tivesse aparecido ou o governo entregasse isso, o que eu estaria fazendo hoje? São coisas que fazem a gente ter empatia com o próximo”, justifica.
Com
apenas R$ 22, o professor criou um computador com duas partições e o uso de um
cartão de memória SD como um HD de computador. A memória primária está em
nuvem. O aparelho, que também tem capacidade de receber sinal Wi-Fi, mede
aproximadamente três centímetros. “O processamento de dados, que é área que a
gente estuda em Harvard, pegou muito pensado nesta parte de microeletrônica,
nanotecnologia, nestes últimos três meses”, conta Ciswal.
O
computador pode ser transportado no bolso, mas precisa de uma tela, seja TV ou
aparelho celular, para ter acesso ao sistema Windows 98, que dá acesso à
internet e programas como Word, PowerPoint e Excel. Porém, Ciswal já está
desenvolvendo seu próprio sistema operacional, que deverá ficar pronto em até
quatro meses. “Vai ser um sistema de fácil acesso para idosos, crianças, para
quem não tem noção de informática. Será muito instrutivo, vai ensinado”,
acredita o professor.
Difusão
Após
apresentar o projeto, Ciswal conta que recebeu uma proposta de um grupo de
empresários de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, que querem investir na ideia
e popularizar o aparelho no continente africano. “Minha intenção era que se
popularizasse primeiro no Brasil. Eu defendo a necessidade do povo. Queria
muito que algum governo, seja municipal, estadual ou federal, pudesse
popularizar. Dar acessibilidade aos jovens, condições de estudo”, defende.
Caso
não apareçam interessados em implantar o projeto no Brasil, Ciswal deverá
colocá-lo em prática fora do país. “Mas a prioridade é do Nordeste, do Ceará.
Vou trabalhar em prol da população daqui”, ressalta.
Trajetória
Nascido
em Palmares, o professor se mudou para Juazeiro do Norte na adolescência quando
seu pai, também professor, foi transferido para a cidade de Serra Talhada (PE).
Após a separação dos pais, as dificuldades financeiras apareceram. Sua mãe
ganhava R$ 15 por faxina. O valor era pouco para o jovem se manter na escola e
sustentar a casa, por isso Ciswal resolveu trabalhar em um mercantil entregando
as feiras de bicicleta.
Depois
de entrar para faculdade, antes de completar os 16 anos, ele teve que buscar no
lixo a solução para continuar estudando. Foi aí que Ciswal resolveu catar
latinhas para reciclagem. O quilo do material custava R$ 2. Em uma semana, conseguia
três quilos e meio. Com essa renda, foi capaz de pagar cópias, apostilas,
livros e impressões.
G1 CEARÁ