O
relato da enfermeira, que pede para não ser identificada, ajuda a entender como
estão sendo cada vez mais tensos os plantões nas unidades de saúde em
Fortaleza. No domingo, na UPA do bairro Cristo Redentor, localizada na avenida
Leste-Oeste, o atendimento chegou a estar simultaneamente com 24 pacientes
adultos com quadro suspeito de Covid-19, onde há apenas 12 leitos na ala
específica para os casos. O ambiente de pediatria e a sala de emergência
precisaram ser utilizados, pela situação extrema. As macas extras vez ou outra
têm funcionado também para o mesmo fim, não mais somente para o deslocamento
interno. O plantão da sexta esteve com 16 pacientes, passou para 15 no sábado,
e mais nove deram entrada com suspeita entre a manhã e noite deste domingo, 19.
"Está sendo assim, só aumentando", pontua. No sábado, 18, um paciente
estava lá e morreu ao ser transferido para o IJF-Centro.
Os
registros mais frequentes de mortes entre os internados deixam a rotina mais
pesada, estressante. "Tem sido difícil", descreve. O agravamento
repercute no risco direto para os profissionais. Monitoramento do Conselho
Federal de Enfermagem (Cofen), em dados reunidos desde o dia 20 de março
último, aponta que, no Brasil, já são 5.174 casos confirmados ou suspeitos de
profissionais da categoria (enfermeiros, técnicos e auxiliares) acometidos de
Covid-19. Quase 3 mil foram registrados só entre a segunda-feira passada (13) e
este fim de semana.
Desses
casos no País, foram 34 mortes no grupo. Um dos óbitos aconteceu no Ceará: uma
técnica (também diplomada como enfermeira), Ana Cristina de Oliveira Braga, de
53 anos, que morreu no último dia 14 de abril. Ela trabalhava em um posto de
saúde no bairro Pan Americano e no Instituto do Câncer (ICC), na Capital.
Passou poucos dias internada e não resistiu. O Estado soma, em dados
atualizados até o último domingo, 19, 201 profissionais da enfermagem em
quarentena com suspeita da doença, outros 25 com diagnóstico confirmado e mais
um internado com suspeita. São 77 mil profissionais no Ceará, entre técnicos e
graduados. Na última sexta-feira, a informação recebida pelo Conselho Regional
de Enfermagem (Coren-CE) era de que mais quatro enfermeiros (um deles do
Interior) haviam sido transferidos para dois hospitais da Capital em estado
grave, necessitando de respiradores.
Um
paciente costuma tossir ao ser entubado, expelindo saliva contaminada se
estiver com o coronavírus. Mesmo no atendimento comum, ainda na sala de
triagem, o perigo do contágio passa perto. A falta de equipamentos de proteção
individual (EPIs), como luvas, máscaras, aventais, tem sido mencionada entre os
profissionais. No mesmo período em que tem contado os casos de Covid-19, o
Coren-CE recebeu 106 denúncias de falta ou escassez de equipamentos de EPIs.
"Fizemos
uma fiscalização no início da semana (passada). Encontramos alguns
profissionais usando EPIs, mas racionalizados", afirma a presidente do
Coren-CE, Ana Paula Brandão. Osvaldo Albuquerque, representante cearense no
Conselho Federal, confirma que "a vulnerabilidade em relação aos
equipamentos de proteção está sendo a principal demanda" para os que estão
na linha de frente no combate ao coronavírus.
Para
tentar amenizar a grande demanda, o Cofen fechou um contrato para adquirir
material de proteção. Cerca de 8 mil máscaras deverão ser enviadas para o Ceará
e distribuídas pela entidade regional, segundo Albuquerque. Também será
oferecido treinamento para melhorar o atendimento diferenciado nos casos da
Covid-19.
"No começo,
nossa média era de dois a quatro pacientes com a suspeita de coronavírus por
plantão. Hoje, são 10, 12, 15. Triplicou, quadruplicou", diz uma
enfermeira de outra UPA, que pediu para não ser divulgada nem sequer a unidade
em que ela atua. O quadro é parecido na maioria delas. Até sexta-feira passada,
havia um médico e uma enfermeira para atender toda a ala dos casos suspeitos de
coronavírus na UPA da Leste Oeste. No fim de semana, a unidade teria recebido
reforço de pessoal, mesmo assim o plantão seguiu bastante agitado.O POVO