Coronavírus: velocidade de propagação da doença traz futuro dramático para o sistema de saúde do país (Bruno Kelly/Reuters) |
O
colapso se consolida quando a capacidade de internação hospitalar nos hospitais
públicos chega ao limite. Estratégias como ampliar leitos de UTI, construir
hospitais de campanha, transferir pacientes para outras cidades e assumir o
controle de leitos de hospitais públicos têm sido feitas no país.
Segundo
Alberto Chebabo, diretor médico do hospital da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, um dos centros de referência para tratar a covid-19 no estado, na
última semana o número de pacientes aumentou
exponencialmente e a projeção é que as duas próximas semanas sejam de “caos
completo”.
O
retrato, avalia, é bem parecido com o visto na Itália, na Espanha e também nos
Estados Unidos, que tiveram o primeiro registro duas semanas antes do Brasil,
em 15 de fevereiro. “A gente conseguiu atrasar o caos inicial, mas as medidas
agora estão caindo por terra no momento em que seria de endurecer o
isolamento”, diz em entrevista à EXAME.
Cauteloso
em comparar o número de casos confirmados entre países, Chebabo explica que há
uma imensa subnotificação e falta de transparência nos testes realizados, o que
impede a população brasileira de saber o verdadeiro cenário da doença.
Dos
países mais afetados, o Brasil é um dos que menos está testando a população.
São 296 testes a cada um milhão de habitantes, ao passo que a Itália registra
20 mil testes a cada milhão, a Espanha, 19 mil testes a cada milhão e os EUA,
10 mil testes por milhão.
Uma
projeção do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (Nois), da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, avaliou que os registros oficiais da
doença no Brasil representam apenas 8% do número real de casos. Segundo os
dados coletados pelos pesquisadores, os índices verdadeiros seriam até 12
vezes superiores.
“Não
precisa comparar número. A gente vê a velocidade da curva subindo cada vez mais
rápido, não só nos números, que triplicam a cada dia, mas nos hospitais, que
estão cada vez mais lotados”, afirma Chebabo.
Essa
lógica pode ser entendida em um gráfico comparando o acréscimo de casos dia a
dia do Brasil, Itália e Espanha. Depois que os países passaram da marca dos dez
mil casos confirmados, o crescimento passou a ser exponencial.
O
Brasil, que tem duas semanas a menos de vírus circulando, desenha o mesmo
caminho. Em menos de uma semana, o país duplicou o número de óbitos, de mil na
última sexta-feira, 10, para 2 mil nesta sexta-feira, 17. Os Estados Unidos
seguem na mesma lógica, mas não foram incluídos no gráfico a seguir para fins
de visualização, uma vez que o país já registra 700 mil infectados.
Caos
no sistema público
Com
a curva ascendente, o principal desafio para o sistema de saúde é atender a
necessidade de leitos de internação. Ao contrário de outras síndromes
respiratórias, a covid-19 pode manter um paciente em estado grave durante 14
dias, com isso reduzindo a possibilidade de rotação das camas hospitalares.
O
infectologista Alberto Chebabo está na linha de frente da operação que vai
ampliar de 12 para 70 os leitos destinados a pacientes com covid-19 no hospital
da UFRJ. Em sua avaliação, “esse número [de leitos] para o Rio de Janeiro é uma
gota”. O estado carioca, que tem mais de 4 mil infectados e 341 óbitos, já tem
ao menos 74% dos leitos de UTI ocupados, segundo informações mais recentes.
Já
São Paulo, que registra 12,8 mil casos confirmados e 928 mortes, tem pelo menos
sete hospitais da capital operando com a capacidade de leitos de UTI acima dos
70%. Nesta sexta, um dos mais importantes para o tratamento, o hospital Emilio
Ribas, chegou ao colapso ao completar o uso de todas as suas 30 vagas.
Essa,
inclusive, foi a semana com o maior número de óbitos em SP: 320 novas mortes
desde a segunda-feira, 13, o que representa uma morte a cada meia hora, em
média.
A
situação no Ceará é mais dramática. Com 2,6 mil casos confirmados e 149 mortes,
nessa semana, o sistema inteiro de saúde colapsou atingindo 100% das vagas de
UTI preenchidas. A explicação do governo para a falta de UTIs é
que as pessoas estão chegando aos hospitais em situação muito grave, tendo de
ser encaminhadas diretamente para UTIs.
No
Amazonas, que tem 1,8 mil pacientes confirmados com a doença e 145 mortes, não
há leitos de UTI, respiradores, nem recursos humanos. O governo está
equipando as unidades hospitalares do estado, lotadas de infectados, com
contêineres frigoríficos para acondicionamento de corpos das vítimas.