Imagem da campanha #obrasilnaopodepararReprodução |
A peça foi distribuída, em forma de teste, para as redes
bolsonaristas. Nela, categorias como a dos autônomos e mesmo a dos
profissionais da saúde são mostradas como desejosas de voltar ao regime normal
de trabalho. "O Brasil não pode parar", encerra cada trecho do vídeo,
inclusive para os "brasileiros contaminados pelo coronavírus".
O primogênito do clã, o senador Flávio (RJ), foi o
responsável por dar o chute inicial desta etapa da campanha #BrasilNaoPodeParar,
em postagem no Facebook na noite de quinta (26). O filho presidencial
é o pivô das investigações criminais acerca de relações entre milícias e
a família Bolsonaro, além de um esquema de "rachadinha" em seu
então gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
A página da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom),
cujo chefe, Fabio Wajngarten, foi contaminado pelo patógeno, divulgou na quarta
(25) a hashtag da campanha.
Além disso, o próprio presidente postou em sua conta em
rede social o vídeo de uma carreata realizada em Camburiú (SC) contrária
ao isolamento social recomendado pela maioria dos governos que lidam com a
pandemia e pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
A ofensiva mostra que Bolsonaro colocou todas
suas fichas na hipótese de que a pandemia, que já matou 77 brasileiros desde o
primeiro caso registrado há um mês, terá impacto reduzido sobre a saúde
pública.
Desde a emergência da questão sanitária, Bolsonaro tem
sistematicamente negado a gravidade da infecção pelo vírus que causa a Covid-19.
Em oposição a ele, os 27 governadores de estado se uniram em uma frente pedindo
recursos federais e medidas para aliviar o impacto econômico da crise.
Os chefes estaduais são liderados não oficialmente
por João Doria, o tucano que governa São Paulo, estado mais
afetado pela crise. Pelo fato de ser um presidenciável óbvio para 2022,
Bolsonaro elegeu Doria como símbolo do que chama de "histeria" em
relação à pandemia.
Com efeito, São Paulo é a unidade da federação em que as
medidas de isolamento social recomendadas pela OMS estão sendo
aplicadas de forma mais rígida, ainda que graduais para tentar evitar um
colapso econômico - o estado concentra 40% do Produto Interno Bruto do país.
Os 46 milhões de paulistas estão sob quarentena desde
terça (23), e a medida deve evoluir para o isolamento total da população neste
momento de expansão do contágio.
Nesta semana, Doria e Bolsonaro se enfrentaram
em uma videoconferência na qual o tucano criticou o pronunciamento do presidente
em que ele mostrou desaprovação por medidas como o fechamento de escolas, e
recebeu em troca a acusação de estar tentando se promover politicamente.
O fato é que os governadores se alinharam às
recomendações da OMS em reunião na quarta que contou com a presença de Rodrigo
Maia (DEM-RJ), o presidente da Câmara que tem agido como chefe do Legislativo
na crise.
Desde então, Maia concedeu duas entrevistas em
que criticou o governo e cobrou ação imediata de Bolsonaro para o envio de
medidas emergenciais ao Congresso -sob pena de os parlamentares tomarem as
mesmas.
Nesta quinta, multiplicaram-se chamamentos virtuais a
carreatas em favor da ideia bolsonarista de que o Brasil deveria voltar à
atividade, embora as quarentenas ainda sejam restritas a alguns estados, São
Paulo à frente. A ironia é que são carreatas, supostamente formas mais seguras
de protestar em tempos de coronavírus.
Muitas convocações estão sendo feitas para a segunda
(30), véspera do aniversário de 56 anos do golpe militar de 1964, objeto de
adoração de Bolsonaro.
A disputa entre Bolsonaro e os Poderes constituídos
isolou o presidente. Primeiro foram os atos do dia 15, no qual manifestantes
apoiados pessoalmente pelo presidente pediam o fechamento do Congresso e do
Supremo, ainda que o titular do Planalto negasse a intenção.
Foi ali que a emergência do coronavírus somou-se à
equação da disputa pelo manejo de R$ 30 bilhões do Orçamento, já que Bolsonaro
abraçou pessoas mesmo sob orientação de ficar em quarentena devido ao contato
com infectados em sua comitiva de uma viagem aos EUA, Wajngarten à frente. Nada
menos que 25 pessoas que tiveram contato com o presidente se contaminaram até
agora.
Depois, Bolsonaro conseguiu galvanizar os governadores
contra si e perdeu o apoio de alguns neste meio, como Ronaldo Caiado (DEM-GO),
um dos símbolos da antiga direita que estavam ao lado do presidente.
Com tudo isso, a peça da Presidência, ainda não
chancelada para veiculação, entra como novo pedaço de lenha na fogueira da
queda de braço entre Planalto e estados, no qual o Congresso está ao lado dos
governadores.