A Justiça Federal do Rio de Janeiro condenou o
empresário Eike
Batista a oito anos e sete meses de prisão por ter
manipulado o mercado de ações, crime
conhecido como insider trading. O ex-bilionário teria usado informação
privilegiada para obter vantagem na venda de ações da empresa de construção
naval OSX.
O
empresário vendeu os papéis da companhia no dia 19 de abril de 2013, antes de a
empresa divulgar ao mercado mudanças no plano de negócios e problemas
financeiros que o grupo enfrentava – o que levou a uma forte desvalorização na
bolsa.
Como
a condenação é em primeira instância, a defesa de Eike vai questionar a
decisão. Desta vez, os crimes de Eike não envolvem a Lava Jato (operação que já
levou o empresário para a prisão em 2017), mas a derrocada no Império X,
conglomerado de empresas que ruiu após ser desacreditado pelos investidores.
Eike
foi condenado pela justiça a pagar uma multa de 82,8 milhões de reais, que em
valores corrigidos equivale a 118,2 milhões de reais.
[“Lucro fácil em prejuízo da coletividade”
Na
sentença, a juíza Rosália Monteiro Figueira argumentou que o ex-bilionário
aproveitou sua larga experiência no mercado de capitais “de modo nocivo” e
incentivou o investimento dos prejudicados na empreitada. Ela justificou a
decisão afirmando que o empresário visou lucro fácil “em prejuízo da coletividade”.
“Qualquer
pessoa, nas mesmas condições do acusado, podia compreender que não é permitido
negociar títulos mobiliários vinculados a companhia em relação à qual se tenha
informações relevantes ainda não divulgadas ao público”, escreveu, concluindo
que Eike sabia que a conduta visava praticar o crime pelo qual foi denunciado.
Segundo
a juíza, Eike teria se aproveitado da fragilidade dos órgãos de fiscalização
para praticar o crime,e citou a proatividade da Securities and Exchange
Commission (a CVM norte-americana) no combate ao uso de
informações privilegiadas e à manipulação de mercado.
Condenado pela Justiça,
absolvido pela CVM
Pelo
Código Penal brasileiro, o insider trading (ou uso de informações
privilegiadas) acontece quando investidores compram ou vendem ativos do
mercado, como ações, em posse de informações relevantes que ainda não vieram a
público, com o objetivo de lucrar ou obter vantagem em detrimento dos demais
investidores.
Pelas
regras da CVM, o xerife do mercado de capitais brasileiro, as empresas que
possuem ações na Bolsa são obrigadas a comunicar os fatos relevantes que possam
influenciar as decisões dos investidores de comprar ou vender as ações que
possuem. Desta forma, o insider que tiver conhecimento de tais fatos deve
informá-los ao mercado o quanto antes. Se a revelação do fato colocar em risco
o interesse da empresa, ele deve se abster de negociar as ações que têm relação
com a informação privilegiada.
A
decisão da Justiça divergiu do entendimento do Conselho de Recursos do Sistema
Financeiro Nacional, subordinado ao Ministério da Economia, e a segunda
instância das decisões administrativas da Comissão de Valores Mobiliários
(CVM).
O
órgão conhecido como Conselhinho absolveu o empresário pelas acusações de
insider trading em um processo administrativo na CVM sobre as operações com a
OSX, no qual foi multado em R$ 21,3 milhões.
Centenas
de processos correm na CVM para investigar suspeitas de insider trading, mas um
percentual muito baixo gera condenações, por tratar-se de um crime difícil de
ser comprovado, segundo o sócio de infraestrutura e societário do Rayes &
Fagundes Advogados, Diogo Octavio Nebias
“Pode
haver condenações diferentes na Justiça e no órgão regulador. Uma condenação
não tem relação com outra”, comenta o advogado.
Na
esfera penal, a reclusão é aplicada quando o juiz conclui que não há dúvidas
sobre a prova material do crime. Já no âmbito da CVM, as punições possíveis
envolvem multa, proibição de operar no mercado e impedimento de exercer cargos
em companhias abertas. Há ainda processos civis parelelos na Justiça,
movidos pelas partes que se sentiram prejudicadas na negociação. No caso de
Eike, ainda há novos capítulos antes de uma condenação definitiva.
Conteúdo Exame