A grave crise fiscal que se
instalou no País abalou o que há de mais seguro no mercado de trabalho brasileiro:
o funcionalismo público. Sem dinheiro em caixa e com uma conta que não para de
crescer, os Estados têm deixado de pagar em dia o salário dos trabalhadores. O
Governo do Ceará mantém em dia o pagamento de salários dos servidores, mas os
professores já anteciparam uma greve porque não tiveram reajuste salarial.
O Governador Camilo Santana (PT), em
reuniões com representantes dos servidores, pediu um prazo de 60 dias, que fica
encerrado ao final de maio, para definir, com base no desempenho da arrecadação
tributária, o percentual de reposição salarial. Impacientes, os professores
decretaram greve. A paralisação dos professores atinge mais de 445 mil
estudantes na Região Metropolitana de Fortaleza e no Interior.
Um levantamento feito pelo Jornal
‘Estado’ de São Paulo com sindicatos e associações de servidores estaduais
mostra que 11 unidades da Federação atrasaram, parcelaram ou escalonaram a
folha de pagamento desde o início da atual gestão. O problema já afeta a vida
de 1,5 milhão de trabalhadores. A expectativa é de que, nos próximos meses,
outros Estados engrossem essa lista.
Hoje, os casos mais dramáticos são Rio
Grande do Sul e Rio de Janeiro – ambos começaram a parcelar salários no ano
passado. Na administração gaúcha, os servidores enfrentam instabilidade desde o
início do segundo semestre de 2015. Além do 13º salário, que só começará a ser
pago em junho deste ano, o salário de março foi parcelado em nove vezes. Em
abril, a medida vai se repetir. “É uma coisa maluca, porque ninguém sabe quando
e nem quanto vai receber”, diz Cláudio Agostinho, presidente do Sindicato dos
Servidores Públicos do Estado.
No Rio de Janeiro, onde 438 mil
servidores foram afetados, o governo chegou ao ponto de abrir uma linha de
crédito no banco para que os trabalhadores pudessem receber a segunda parcela
do 13º salário, com juros pagos pela Fazenda. Por ora, segundo a Secretaria da
Fazenda, os salários estão em dia. Mas o calendário de pagamentos foi alterado.
Outros Estados seguiram a mesma
estratégia de mudar a data de depósito do salário, como Rio Grande do Norte e
Tocantins. “Antes era dia 30, depois passou para dia 3, dia 5 e agora dia 10.
Não há um calendário definido antecipadamente. Não podemos nos programar”,
afirma a presidente da Associação dos Servidores Públicos do Rio Grande do
Norte, Angélica Soares, lembrando que o Estado atrasou o pagamento no ano
passado.
A justificativa para a mudança na data
do Tocantins foi o repasse das verbas federais. O pagamento passou do 5º dia
útil para o dia 12. “Não temos liquidez financeira. Dependemos do repasse do
FPE (Fundo de Participação do Estado, destinado aos governos estaduais e pago
pela União) no dia 10 para pagar a folha no dia 12”, afirma o secretário de
administração do Estado, Geferson Barros.
Com o caixa debilitado, Minas Gerais
não só atrasou o salário em dezembro como foi obrigado a parcelar os pagamentos
seguintes. A Secretaria de Gestão e Planejamento do Estado atribuiu o atraso,
sobretudo, à forte queda da arrecadação do ICMS em 2015.
O recuo das receitas também colocou o
Amazonas em dificuldades. Há dois meses, os médicos terceirizados estão sem
receber o salário. Boa parte deles formou cooperativas para prestar serviço ao
Estado e depende do repasse da administração para garantir o salário. “Temos
tido problemas por causa do recuo da atividade no Estado do Amazonas”, afirma o
Secretário da Fazenda do Estado, Afonso Lobo Moraes. “Nesse quadro, a nossa
arrecadação teve um recuo expressivo, por isso existe essa dificuldade de
manter o pagamento dos fornecedores em dia”, diz.
O fato é que, para muitos Estados, a
conta não fecha mais. O resultado foi parar no contracheque dos servidores e
dos trabalhadores terceirizados que prestam serviço para a administração
estadual. Mesmo aqueles que ainda não foram atingidos pelos atrasos também têm
prejuízos. Alguns governadores congelaram os salários e benefícios já
concedidos.
Em meio ao caos, os Estados tentam
renegociar suas dívidas com a União. Na semana passada, o Supremo Tribunal
Federal decidiu suspender o julgamento sobre a mudança de juros compostos para
juros simples no cálculo da dívida. A intenção da corte é de que as partes
negociem entre si como ficará a questão.
A deterioração das contas estaduais
teve origem na forte queda da arrecadação, sobretudo do ICMS – o principal
imposto estadual –, e pela alta do endividamento. Nos últimos anos, até os
Estados com baixa capacidade de tomar empréstimos foram autorizados pela União
a elevar a dívida. “A queda de arrecadação colocou os Estados numa situação
dramática”, diz Raul Velloso, especialista em contas públicas. Parte da piora
do quadro fiscal também é explicada pela redução dos recursos do FPE destinados
aos Estados e pagos pela União.
Na avaliação do economista, o retrato
das finanças estaduais também reflete decisões adotadas pelo governo federal.
Em janeiro deste ano, por exemplo, a presidente Dilma Rousseff reajustou o piso
salarial dos professores em 11,36%. A medida foi tomada mesmo a contragosto dos
governadores que pediam um aumento menor ou até mesmo o cancelamento do
reajuste. “Os Estados não têm muita escolha. Diante do tamanho do
comprometimento da receita com pessoal e serviço da dívida, não sobra nada”,
diz Velloso.
ESTADOS COM PROBLEMA
Amapá
Desde março, o governo paga 60% do
salário até o último dia útil do mês e 40% no quinto dia útil do mês
subseqüente
Amazonas
Médicos terceirizados do Estado estão
com salários atrasados há dois meses
Distrito Federal
Há atrasos no pagamento das horas
extras de janeiro para os funcionários da saúde
Goiás
Governo do Estado dividiu os
pagamentos em dois grupos: os que ganham até R$ 3,5 mil recebem no dia 30;
acima desse valor recebem no dia 10
Minas Gerais
Pagamento de dezembro dos salários foi
feito apenas no dia 13 de janeiro. Dali para frente, o Estado passou a parcelar
os salários dos trabalhadores
Pernambuco
Estado não repassou recursos para as
Organizações Sociais (OS) e os médicos terceirizados não receberam salário. O
governo afirma que repasses estão regularizados
Rio de Janeiro
Em março, todos os servidores ativos
receberam o salário integral no 10º dia útil. Entre os aposentados e
pensionistas, os que ganham até R$ 2 mil líquidos receberam no 10º dia útil. Os
demais receberam na última segunda-feira por meio de arresto judicial nas
contas do Estado
Rio Grande do Norte
Salário era pago dia 30, passou para
dia 3, dia 5 e agora vai ocorrer nos dias 6, 9 e 10 de maio
Rio Grande do Sul
Atraso começou no segundo semestre do
ano passado. Em março, o salário foi pago em nove parcelas
Roraima
Em outubro, pagamento dos servidores
públicos, feito até o
5º dia útil do mês foi depositado no
dia 10
Sergipe
Em outubro, governo mudou a data de
pagamento do salários dos trabalhadores, que agora vai do dia 1º ao dia 10 do
mês seguinte. Os salários de novembro e o 13º foram parcelados.
Fonte: Ceará
Agora