"Eu respeito a autodeterminação dos povos, por isso
peço o mesmo ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a seu pupilo (Aécio)
Neves. Gostaria de dizer a eles que, por favor, não se envolvam em assuntos
internos da Venezuela, dando apoio a grupos extremistas responsáveis pela morte
de mais de 40 pessoas".
A afirmação é de Tarek William
Saab, que encabeça a Promotoria do Povo (órgão do Ministério Público
especialmente ligado ao Poder Cidadão da Venezuela), em entrevista para Carta
Maior, a respeito do que ele descreveu como "o apoio de FHC e Aécio aos
dirigentes golpistas do meu país à conspiração contra os esforços para o
diálogo realizados pelo governo do presidente Nicolás Maduro".
Na última terça-feira (5), FHC
recebeu as esposas de Leopoldo López e Antonio Ledezma, políticos
"processados por seus vínculos com a onda de violência insurrecional que
deixou 43 mortos no ano passado", recordou Saab, pouco depois de chegar em
Brasília, para reuniões marcadas nesta quinta no Senado e "um possível
encontro com alguns ministros do governo".
Carta Maior: Segundo se informou,
FHC poderia fazer, em breve, uma visita a Caracas, na condição de membro do
Clube de Madrid?
Tarek William Saab: Isso seria
uma interferência inaceitável por parte do ex-presidente Cardoso. Sua atitude,
e seu pupilo (Aécio) Neves, deve terminar, não podemos admitir este tipo de
intromissão lesiva à soberania nacional da Venezuela. É inadmissível, uma
agressão, e digo isso na condição de presidente de um dos cinco poderes da
República, que é o Poder Cidadão. É lamentável que Cardoso seja parte das
campanhas do Clube de Madrid.
CM: O que é o Clube de Madrid?
TWS: Um grupo formado por muitos
ex-presidentes, lá está o ex-mandatário espanhol Felipe González que foi
declarado persona non grata na Venezuela. Vou dizer de forma mais direta, o
Clube de Madrid é um cartel integrado por assassinos, processados por crimes
contra os direitos humanos, como José María Aznar (ex-presidente da Espanha,
sucessor de González, embora seu opositor histórico).
As tropas espanholas também
participaram da matança contra iraquianos durante a invasão norte-americana, na
década passada, quando Aznar, do conservador Partido Popular, fez o país apoiar
substantivamente a missão. Quando Felipe González (do Partido Socialista Operário,
de centro-esquerda) foi presidente, entre os Anos 80 e 90, o país financiou um
grupo de extermínio parapolítico chamado GAL (Grupos Antiterroristas de
Libertação). Outro que está no Clube de Madrid é Álvaro Uribe, ex-mandatário
colombiano, um monstruoso violador dos direitos humanos em seu país, que foi
processado e é conhecido no planeta como um criminoso protegido pelos Estados
Unidos.
Mas não nos equivoquemos, o Clube
de Madrid não é só Felipe González, e Aznar, e Uribe, e Cardoso. Quem realmente
dirige o grupo é Barack Obama, ele é o dono desse circo. Há 15 anos, os Estados
Unidos estão por trás das conspirações para desestabilizar o governo
progressista da Venezuela. E há 15 anos o povo venezuelano tem feito um
trabalho heroico de resistência contra esse plano conspiratório internacional.
CM: O que você acha da opinião da
presidenta Dilma Rousseff?
TWS: Ela tem contribuído para a
harmonia na Venezuela, através de suas participações na Unasul, na Celac, em
seus pronunciamentos contra a decisão de Obama de declarar a Venezuela uma
ameaça. As posições do governo brasileiro propiciam o entendimento em nosso
país, e facilitam a existência de um ambiente pacífico. Seguindo nesse ponto,
quero destacar a importância que tem a rejeição popular às medidas arbitrárias
de Obama, como as que vimos no mês passado, na Cúpula das Américas, no Panamá,
que enfrentou uma posição unitária dos países latino-americanos, todos contra a
postura estadunidense.
CM: As esposas de López e Ledezma
disseram que a Venezuela é uma ditadura, onde há dezenas de presos políticos.
TWS: Primeiro, digo que na
República Boliviariana da Venezuela existem cinco poderes que constituem o
Estado. Eu presido um deles, e respeito a autonomia dos demais. Os senhores
López e Ledezma estão sendo processados pelos tribunais penais, completamente
autônomos do poder político.
No caso de López, a acusação é de
autoria intelectual de uma avançada violenta iniciada no começo de 2014, onde
houve 43 mortos. Está sendo responsabilizado por instigar a insurreição
violenta e por desconhecer as autoridades eleitas.
CM: Os presos estão recluídos em
condições dignas?
TWS: Da nossa parte, como
instituto responsável por velar pelos direitos humanos, posso garantir que
temos visitado o senhor López em seu lugar de detenção, e comprovamos que está
em condições absolutamente dignas. No caso de Ledezma, ele já não está em um
presídio. É importante que a opinião pública internacional, que muitas vezes é
enganada pelas grandes cadeias mundiais de notícias, saiba que Ledezma está em
sua casa. Ele teve um problema de saúde, parece que foi uma hérnia, e por essa
razão foi concedida a mudança no lugar de detenção, aplicando o benefício da
prisão domiciliar.
CM: Politicamente falando, qual é
a representatividade de López e Ledezma?
TWS: Eles formam parte da
oposição, representam o setor mais radicalizado e extremista, que é visto com
simpatia pelos Estados Unidos. Optaram pela via insurrecional, de
desconhecimento da legitimidade de um presidente eleito, como Nicolás Maduro, que
venceu nas urnas com uma vantagem de mais de 200 mil votos. Em nenhum país do
mundo discute-se a legitimidade de um presidente que ganhou as eleições. Nem Al
Gore objetou a polêmica vitória de George W. Bush em 2000. Embora em 2014, em
El Salvador, a agrupação ultradireitista Arena questionou o triunfo da Frente
Farabundo Martí, que foi muito estreito (0,3%), o que talvez seja uma nova
tendência de alguns grupos políticos no continente. Mas é muito importante que
a opinião pública brasileira saiba que López e Ledezma não são representativos
de toda a oposição venezuelana, que essa é uma mentira na que as cadeias
internacionais, como a CNN, repetem muito.
CM: O que reproduz a postura
hostil da CNN para com o governo venezuelano.
TWS: É verdade, mas foi um exemplo,
não quero ficar somente no que faz este ou aquele canal de notícias. Prefiro
falar dos senhores da imprensa em geral, o golpe de Estado contra o presidente
Hugo Chávez, em 2002, foi comandado pelos canais de televisão privados. Um
almirante golpista chegou a admitir - se não houvesse sido pela participação da
imprensa no golpe, ele não haveria acontecido.
É preciso acabar com esse costume
na América Latina, onde os senhores dos meios de comunicação se sentem no
direito de impor e derrubar presidentes, impor deputados, governadores, etc.
A política deve ser feita com as
pessoas e para elas, deve ser feita nas ruas, deve ser feita com debates, com
ideias. Não pode ser feita por alguns poucos donos de empresas de comunicação
manipulando as pessoas. A política não pode ser feita só do lobby das
multinacionais.
CM: Como quais?
TWS: Por exemplo, um lobby que
pode ser considerado um dos mais poderosos do planeta é o lobby sionista,
vinculado às grandes instituições financeiras, aos grandes meios de comunicação,
à indústria cinematográfica de Hollywood, à indústria discográfica, à indústria
do espetáculo e das notícias sobre as celebridades. Entre tantas outras áreas
onde ele atua, esse lobby também participou da conspiração contra a Venezuela,
assim como o lobby das grandes transnacionais, que não aceitam que o meu país
viva uma revolução e que busque sua independência, sua soberania e sua
autodeterminação.
Tradução de Victor Farinelli.
Fonte: Brasil 247.













