O blogueiro Miguel do Rosário, do
Cafezinho, vê "histeria" no artigo publicado ontem pelo 'historiador'
tucano Marco Antonio Villa, em que "exige" impeachment ou renúncia da
presidente Dilma Rousseff (leia mais). Segundo Rosário, "o choro
de Villa é o sorriso de Dilma". Leia abaixo seu comentário:
“Por trás de um homem triste, há sempre uma mulher feliz”,
diz a canção de um dos mais ilustres cabos eleitorais de Dilma Rousseff.
A letra de Chico Buarque encaixa-se como luva no
desespero de Marco Antonio Villa, historiador ultra-tucano e pau para toda a
obra da mídia corporativa.
Desde meados do governo Lula, quando a mídia tentou derrubar
o governo transformando o mensalão, um caso vulgar de caixa 2, num escândalo
quase metafísico, Villa tornou-se num de seus pitbulls mais constantes. Digamos
que ele passou a viver disso. Tornou-se um dos primeiros pistoleiros
profissionais na guerra da mídia contra o PT.
O divertido, se é possível falar em diversão numa guerra que
põe em risco a estabilidade política de um país com 200 milhões de pessoas, é
constatar que os pitbulls levam a sério o trabalho que fazem. Eles vestem a
camisa mesmo. Não é à toa que Merval Pereira, outro pitbull anti-PT, chorou ao
vivo, ou chegou bem perto disso, diante das câmeras da Globo, ao anunciar a
segunda vitória de Dilma Rousseff, ano passado.
Hoje é o dia de Villa pagar o seu mico federal.
O artigo
histérico que publica hoje no Globo, exigindo “renúncia”
ou “impeachment”, indica que o golpe começou a fazer água. O nervosismo do
historiador reflete essa frustração.
Por que o golpe faz água?
1) Sergio Moro e os procuradores da Lava Jato começam a ser
desmoralizados, e por suas próprias trapalhadas. Moro publicou artigo em que
pede mudança constitucional, para validar a execução da prisão antes da
sentença em trânsito em julgado. Ou seja, prender o cidadão antes que a Justiça
analise completamente o processo e decida se ele é realmente culpado. Os
procuradores da Lava Jato também já publicaram textos em que defendem
abertamente medidas ilegais ou imorais. Primeiro publicaram texto defendendo o
uso da prisão como meio de tortura psicológica para convencer réus a fazerem a
delação premiada. Depois publicaram outro texto defendendo uso de prova
“ilícita”. E agora posaram para a capa da Folha, comparando-se a trupe de Eliot
Ness, numa foto que entrará para os anais do ridículo, e que violou o código de
ética do Ministério Público, o qual exige impessoalidade no trato com a
imprensa.
O artigo de Sergio Moro, pedindo prisão para inocentes, foi
rechaçado radicalmente até mesmo por juristas conservadores, como Celso de
Mello.
Ficou evidente, para todo mundo, que Sergio Moro e os
procuradores da Lava Jato não leram Machado de Assis. Não leram, especialmente,
o conto O Alienista, em que um doutor resolve mandar a cidade inteira para o
hospício.
Entretanto, Moro não está sozinho. As decisões de negar
habeas corpus aos réus, por razões de “ordem pública” tem sido chanceladas por
desembargadores do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O corporativismo judiciário está fazendo política, e isso é
perigoso. O lado bom, porém, é que o judiciário rasgou a sua fantasia
democrática. E terá que lidar agora com a crítica dura da sociedade, que não
quer ser governada por uma ditadura de juízes, sobretudo juízes que não são
melhores que ninguém em termos de ética ou moral.
2) A deflagração da Operação Zelotes dá a chance, para o
governo, de mudar completamente a narrativa midiática sobre a luta contra a
corrupção no Brasil. O governo federal pode voltar a ser o mocinho da história,
se souber lidar com o tema com um mínimo de inteligência em matéria de
comunicação.
Afinal, agora está claro que a luta contra a corrupção só é
real, só é objetiva, se os órgãos de fiscalização, como a Polícia Federal e o
Ministério Público, investigam o governo e os partidos governistas. É o que está
acontecendo. É o que não acontecia antes.
A PF antes era inútil. Não investigava nada, sobretudo
graúdos da política e do empresariado. De vez em quando, só para o povo não
esquecer que ela existia, aparecia no Jornal Nacional queimando algumas
toneladas de maconha velha, que os traficantes entregavam justamente para que a
polícia fingisse trabalhar.
O Ministério Público também investigava muito pouco. E quando
investigava não ia adiante. A razão era o velho patrimonialismo. A classe
política tinha relações históricas com o Ministério Público. Eram primos,
compadres, amigos.
Hoje não.
Hoje os procuradores não tem mais intimidade com a cúpula no
poder. Ao contrário, alimentam ódio político contra os boias-frias do PT que
ocupam os altos escalões da república.
Esse ódio, se controlado, produz uma energia investigativa
rara entre os procuradores, quando se trata de combater a corrupção na
política.
Quando exagerado, porém, o ódio pode se transformar em
perseguição e leva alguns procuradores a participarem de conspiratas políticas,
em conluio com a oposição e a imprensa.
Mas como eu dizia, a operação Zelotes e a CPI do Suiçalão,
consolidam outra narrativa, a de que o governo Dilma combate efetivamente a
corrupção.
3) A terceira razão para o esvaziamento do golpe é o bom
senso dos agentes econômicos. Os grandes bancos brasileiros não vão se suicidar
apenas para a mídia dar seu golpe baixo contra o governo. O Bradesco acaba de
renovar o crédito da 7 Brasil, uma das fornecedoras mais importantes da
Petrobrás, que andou perigando. A China entrou ajudando a Petrobrás,
emprestando-lhe mais de R$ 11 bilhões, a juros amigos, permitindo à estatal
respirar fundo. As ações da Petrobrás voltaram a se valorizar, de maneira
bastante sólida. O preço do petróleo aumentou, apesar da retirada das sanções
ao Irã, por causa da decisão da Arábia Saudita de vender mais caro à China.
4) Por fim, o fator tempo ajuda o governo Dilma. A mídia
tenta vergá-lo através da estratégia do “choque e terror”, inventando um novo
escândalo terrível todo dia, tentando mantê-lo acuado, paralisado. Entretanto,
conforme os dias passam, o governo continua lá, os agentes políticos vão se
adaptando às novas circunstâncias. O ser humano se adapta a tudo, até mesmo à
crise, que vai se tornando uma coisa normal. As pessoas querem trabalhar, e os
empresários começam a refletir sobre os riscos de criar uma convulsão política
no país, apenas para satisfazer os anseios de uma mídia golpista e de
hidrófobos que defendem até mesmo uma intervenção militar.
Cada dia que passa, e Dilma continua lá, ela ganha força, até
mesmo porque vai aprendendo com os erros, e foram muitos os erros do governo.
5) O PT continua cometendo inúmeros erros. Os recentes textos
chorosos, autopiedosos, falando em perseguição ao partido, foram apenas a
última derrapada, mas a legenda tem mergulhado numa reflexão profunda sobre si
mesmo, sobre a necessidade de buscar forças na sua base social.
6) Outro motivo para esvaziamento do golpe é a desmoralização
da oposição política. A briga sangrenta entre Demóstenes Torres e Ronaldo
Caiado, que respingou em Agripino Maia, revelou de maneira cristalina a
hipocrisia de setores da oposição quando se arvoram em paladinos da ética. O
Suiçalão (contas secretas na Suíça) trouxe nomes dos barões da mídia, colunistas
e ricaços paneleiros, que não pagam impostos e, portanto, são criminosos.
O constrangimento da imprensa, que não produz infográficos,
não inventa apelidos, não abre seções especiais, na cobertura da Operação
Zelotes e da CPI do Suiçalão, também a desmascarou, tanto que a própria
Ombudsman da Folha, Vera Magalhães, admitiu que o jornal não deu destaque à
Zelotes.
A Zelotes, é bom lembrar, lida com desvios de verba pública
dezenas de vezes superior àqueles verificados na operação Lava Jato, e não traz
nenhum risco de desemprego em massa no país.
Os responsáveis pela Zelotes, além disso, não estão prendendo
empresários indiscriminadamente, à espera que eles “delatem” outros esquemas.
Ao contrário da Lava Jato, a operação Zelotes tem sido conduzida com prudência
e respeito à lei.
7) Um artigo publicado hoje do ex-ministro
do STJ, Gilson Dipp, no qual desqualifica as delações de Alberto Youssef, traz
um forte prejuízo para a operação Lava Jato. Dipp diz o óbvio: Youssef foi
beneficiado antes por delação premiada e não respeitou a Justiça, voltando a
cometer crimes. Qual o sentido de lhe dar, novamente, esse benefício?
8) O advogado Nelio Machado dá
entrevista, ao Espaço Público Brasil, em que critica
duramente o juiz Sergio Moro. Machado lembra que Moro louva os juízes da
Operação Mãos Limpas, na Itália, esquecendo, porém, que não eram propriamente
juízes, mas juízes de instrução, condição similar ao procurador brasileiro. Ou
seja, Moro se identifica, qual Joaquim Barbosa, apenas com a acusação. Esses
juízes de instrução não julgam ninguém, apenas apuram os fatos. Machado lembra
ainda que a Operação Mãos Limpas produziu milhares de prisões arbitrárias, e
abusou indecentemente da delação premiada, de vazamentos seletivos, etc.
Machado pede o impedimento de Moro dizendo que se trata de um juiz comprometido
politicamente, que não respeita as garantias individuais devidas aos réus, é
leniente ou mesmo cúmplice com vazamentos seletivos, e se mostrou aliado à
mídia de oposição. O advogado usa o mesmo argumento de Dipp, que é essa
estranha decisão de Moro de conceder uma segunda delação premiada a um réu que
não honrou a primeira. Lembra ainda que as delações dos empresários, em
condições carcerárias desumanas, com ameaças inclusive a seus familiares,
violam a lei da delação, que exige a voluntariedade do depoimento.
*
Os riscos à democracia permanecem grandes, mas menores do que
antes. A mídia agora deve usar todas as suas forças para promover o dia 12 de
abril, porque será a sua última chance de criar um clima para o impeachment. Ao
fazê-lo, porém, a mídia se expõe ainda mais, e isso também é um risco.
Setores importantes e crescentes da opinião pública estão
consolidando uma percepção sobre o papel nocivo que a imprensa passou a
desempenhar em nossa democracia.
A aprovação de Dilma caiu, mas uma boa parte desta
impopularidade advém do próprio eleitorado dilmista, insatisfeito com a
passividade política do governo, que não reage a seus adversários, e não sabe
dialogar com sua própria base social.
Se há necessidade de ajuste fiscal, faça-se o maldito ajuste
fiscal, mas sem transformar isso na única bandeira de governo!
Que se compense o ajuste fiscal com iniciativas ousadas fora
do campo da macro-economia.
Faça-se alguma coisa pelos índios, pela reforma agrária, pela
comunicação, pela cultura, pela política externa!
Os alertas do líder do MTST, Guilherme Boulos, são
verdadeiros. Os movimentos sociais terão dificulade para defender Dilma do
exército de lobotomizados que a direita tem levado às ruas, inclusive com
dinheiro internacional, se o governo não oferecer uma plataforma política que a
sua base possa defender.
Essa plataforma política tem de ser vista, tem de ir para a
TV, para o rádio, para as redes sociais. Tem de estar na ponta da língua da
presidenta.
De qualquer forma, a comunicação da presidenta melhorou
sensivelmente. Dilma está falando mais. Todo dia aparece nos telejornais, dando
entrevistas ou se posicionando.
A entrada de Janine Ribeiro no ministério da Educação
oxigenou maravilhosamente a imagem do governo, e o ingresso de Edinho Silva na
Secom trouxe esperanças de uma comunicação mais criativa.
O maior perigo vem das conspiratas judiciais, desse conluio
entre tortura psicológica de réus, conduzida por um juiz e procuradores,
embriagados pelos holofotes da Globo e apupos de uma opinião pública
manipulada, e uma imprensa decadente, disposta a correr todos os riscos para
garantir a sua sobrevivência.
Se o governo fizer uma marcação inteligente contra os
desmandos judiciais por trás da Lava Jato, evitando tanto a sabotagem da
economia quanto a construção de mais uma série de factoides midiáticos contra o
PT, poderá virar o Cabo das Tormentas e começar, enfim, a governar.
Fonte: Brasil 247.