"Fala-se muito em liberdade de imprensa como sendo uma
coisa importante por uma razão óbvia: onde é que nós recebemos informações
sobre o Brasil e sobre o mundo? É pela mídia. Logo, se ela nos der uma
informação truncada, orientada, encaminhada para valorar certas coisas e
desvalorizar outras, o que nós brasileiros vamos ter dentro da cabeça?”,
questiona o jurista Celso Bandeira de Mello, um dos principais nomes do Direito
no País.
Ele é considerado um dos expoentes do
Direito Administrativo no Brasil, é a quinta geração envolvida com o mundo
jurídico na sua família, começou como professor da Faculdade de Direito da PUC,
onde mais tarde se tornou vice-reitor acadêmico. Aos 78 anos acumula os títulos
de professor honorário da Faculdade de Direito da Universidade de Mendoza, na
Argentina; da Faculdade de Direito do Colégio Mayor de Rosário, em Bogotá
(Colômbia), membro correspondente da Associação Argentina de Direito
Administrativo, membro honorário do Instituto de Derecho Administrativo da
Faculdade de Direito da Universidade do Uruguai, professor extraordinário da
Universidade Notarial Argentina e membro titular de seu Instituto de Derecho
Administrativo e professor titular visitante da Universidade de Belgrano -
Faculdade de Direito e Ciências Sociais, também da Argentina.
Estamos
falando de Celso Antônio Bandeira de Mello, que em entrevista concedida ao
jornalista Luis Nassif, no programa Brasilianas.org (TV Brasil)
reconheceu a necessidade de uma reforma no poder judiciário. Para ele, os
ministros do Supremo Tribunal Federal deveriam ocupar o cargo por no máximo
oito anos. Hoje, o cargo é vitalício.
“Uma
ministra do Supremo [Tribunal Federal] me disse, não faz muito tempo: ‘tanto
nos chamam de excelência que a gente acaba pensando que é mesmo’”. Segundo o
professor, a ministra em questão se referia à necessidade de se estabelecer um
limite para os mandatos no STF.
Ele
ponderou que o conservadorismo ainda é um dos elementos que atrapalham o
aprimoramento das relações entre o poder judiciário e o cidadão comum. E
criticou severamente a imprensa brasileira. “Eu considero que o maior inimigo
do Brasil, o mais perigoso inimigo do Brasil, é a mídia brasileira e do jeito
que ela é”.
E
explica: “Fala-se muito em liberdade de imprensa como sendo uma coisa importante
por uma razão óbvia: onde é que nós recebemos informações sobre o Brasil e
sobre o mundo? É pela mídia. Logo, se ela nos der uma informação truncada,
orientada, encaminhada para valorar certas coisas e desvalorizar outras, o que
nós brasileiros vamos ter dentro da cabeça?”. Bandeira de Mello defende o
aumento do nível cultural da população para se contrapor aos efeitos deletérios
da imprensa.
Durante
o debate, o professor abordou a histórica polarização entre a Faculdade de
Direito da USP "Largo de São Francisco" e a Faculdade de Direito da
PUC; falou das suas principais influências e críticas em relação ao julgamento
da Ação Penal 470.
“Estava
tão indignado com a decisão do Supremo. Isso me fez pensar que, se eu vivesse
de renda, fecharia meu escritório no dia seguinte, não admitiria reedição mais
de livro nenhum meu, porque o direito acabou”, declarou.
Bandeira
de Mello pontuou, ainda, que o direito administrativo brasileiro é,
historicamente, autoritário quando deveria ser literalmente o oposto. “O
direito administrativo nasceu exatamente [durante a constituição] do estado de
direito, com o esforço para a contenção dos poderes do estado e valorização do
cidadão”. E foi esse princípio que procurou, junto com Geraldo Ataliba,
inspirar no curso de especialização de direito administrativo da PUC, realizado
durante a ditadura militar. Ele conta que objetivo das aulas era o de
questionar “todas as manobras que levavam o poder a querer se prevalecer sobre
o cidadão”. O curso chamou a atenção dos órgãos de repressão, mas não chegou a
ser fechado.
“Nesse
período éramos alertados para ter cuidado, porque falávamos muita coisa. Mas eu
tinha um realismo sutil de saber que eu não tinha importância suficiente para
ser preso”, ironizou. Com o final da ditadura militar, se alastrou no Brasil um
movimento para a construção de uma nova Constituição Federal. Como advogado,
Bandeira de Mello colaborou com o PMDB. “Mas foi uma assessoria inútel. Os
deputados não queriam ser assessorados, foi uma coisa figurativa”.
Ainda
assim conseguiu emplacar o Artigo 37, que legisla sobre a administração pública
no país. “Não está exatamente nos termos que eu encaminhei para ele”, se
referindo ao então líder do PMDB no Senado Federal, Fernando Henrique Cardoso.
Bandeira de Mello ressalta que, décadas mais tarde, já como presidente, FHC
“fez o possível e o impossível para tentar mutilar a constituição”, dizendo-se
ingênuo por um dia ter admirado o ex-presidente.
Fonte: Brasil
247.