Um
dia desses, Washington Olivetto mostrou porque é mestre num evento promovido
pela ESPM e pela Folha, em São Paulo.
“Você tem de um lado o cara politicamente correto, que é
cerceador e educadinho. Do outro, o incorreto, que é mal educado e
pseudo-divertido. Temos que buscar o que é politicamente saudável, que respeita
a inteligência, mas com irreverência e bom humor”.
Touché.
O politicamente
saudável deveria ser o bull’s eye de
qualquer tipo de humor, e até de qualquer tipo de produção artística. Ser o
mais criativo, instigante e provocador possível sem exceder os limites da
decência humana.
O
problema é que não é tão fácil assim encontrar esse equilíbrio. Aliás, não é
nem um pouco fácil.
“Sexo e as Negas” foi muito criticado. É absurdo? É apenas
provocador? E o ensaio da Vogue com crianças em poses aparentemente sensuais? E
o comentário do Faustão sobre o “cabelo de vassoura de bruxa” da dançarina da
Anitta? E aquela instalação de alguns anos atrás em que o artista Habacuc
deixou um cão passando fome num museu de Nicarágua?
Nesses casos, me lembro de uma passagem das mais brilhantes
(embora um pouco piegas) do seriado Friends: a irmã diz para o irmão que o odiava
quando eram crianças. Ele acha estranho, afinal sempre tinham se divertido
muito. Ela responde que ele a provocava, irritava, sempre conseguia as coisas
do seu jeito.
“E
isso não era divertido para você?”
Todo mundo, provavelmente, já esteve nas duas posições em
algum momento. O agressor nunca tem a noção de como isso chega ao agredido.
Para o agressor, muitas vezes, é só diversão.
Quando Faustão disse que o Brasil estava ficando chato,
depois de ver a reação que a piada com o cabelo da moça provocou, pensei nisso.
Para o Faustão, a piada era só parte do divertimento. Para a moça e para tanta
gente que se viu de alguma forma ofendida com o “cabelo de vassoura de bruxa”,
não.
Aí, sempre ficamos divididos como, aliás, temos nos
acostumado a ficar: cria-se a turma dos “malditos impositores do politicamente
correto” e a dos “malditos chovinistas que falam sem pensar nas implicações”. E
entender onde realmente está o politicamente saudável, como definiu Olivetto, é
muito duro.
Quantas vezes algo foi visto pelo
senso comum como escandaloso e, posteriormente, a história se encarregou de
colocar no seu devido lugar de grande arte? Ao mesmo tempo, quantas vezes houve
assédios de toda natureza com povos inteiros vistos como normais e que a
história tratou de colocar, também, no seu devido lugar de aberração?
Um valor que aprendi com meu pai, provavelmente o mais
importante de todos, é ser igualmente respeitoso com quem está socialmente
abaixo e acima de você.
Assim, me parece que uma forma interessante de encontrar o
politicamente saudável é pensar se você faria a mesma piada com pessoas ou
grupos que poderiam lhe tirar o emprego ou dificultar a sua vida de alguma
forma.
Quem, no Brasil, teve uma atitude exemplar nesse sentido foi
o humorista Felipe Xavier. Criou Dr. Pimpolho inspirado no Tutinha, então
poderoso dono da Jovem Pan.
Aí a questão é: você diria que a mulher de Roberto Irineu
Marinho tem cabelo de vassoura de bruxa? Duvido. Pediria poses sensuais para a
filha do editor? Talvez sim, se fosse parte do combinado. Escreveria “O Sexo e
os Judeus”? Não sei. Colocaria o cachorro do dono da galeria para passar fome?
Nem a pau.
Quando
a resposta é “não”, não é arte, nem humor. É só exercício de poder.
Fonte:
Diário
do Centro do Mundo.













