Cada passo do
governador Cid Gomes (Pros) fora do Palácio da Abolição é escoltado por
policiais militares e seguranças à paisana – prerrogativa comum aos chefes de
Estado, garantida por lei. Vez ou outra, diz ele, a guarda é dispensada, e Cid
se permite o papel de cidadão comum em Fortaleza. No último domingo, foi à
praia: “Vi, em cinco ou seis pontos, a presença da polícia na rua”, destaca. O
relato, feito ao O POVO durante entrevista exclusiva na última terça-feira (8),
foi parte de uma declaração na qual Cid defendeu a política de segurança
pública de sua gestão. Apesar dos índices de criminalidade, ele diz que não
levará frustrações quando deixar o cargo, daqui a oito meses. Transparece a
sensação de dever cumprido – ou, pelo menos, se esforça para transparecer.
Já no fim da
entrevista, ao ser indagado se teme carregar a pecha relacionada à violência,
Cid pausou. Respirou fundo, mexeu nos objetos próximos ao sofá, e fez
ponderações sobre o que pareceu ser uma preocupação natural de quem já se
despede do cargo. Abaixo, trechos da conversa.
O POVO - Recentemente divulgamos que,
entre 17 de março e 6 de abril, sete pessoas foram mortas durante assaltos em
Fortaleza. Qual a autocrítica do Governo na área de segurança pública?
Cid Gomes - Tenho
sempre que resistir e continuar tentando. Não me resigno, nem dou por perdida
essa batalha. E de alguma forma, pondero que você não pode voltar o filme, para
saber como seria hoje se não tivesse sido feito o que foi feito. De cada dois
policiais na rua, um foi colocado no meu governo. Os compromissos que assumi,
cumpri todos. Meu compromisso era implantar uma policia comunitária na região
metropolitana de Fortaleza; avancei. Eu dizia: priorizar a questão de
segurança, com ações, orçamento. E o orçamento foi duplicado ao longo do meu
governo. Repito: como estaria se a gente não tivesse feito isso? Para além
disso, se falou: “O problema é capacitação dos policiais”. E nós implantamos
uma coisa que o Ceará nunca teve, que foi a academia de polícia, que só quem
tinha era oficial. Falou-se na melhoria da inteligência, criamos a Perícia
Forense, equipada com o que há de mais moderno. Falou-se na má conduta de
alguns profissionais da área, então implantamos uma controladoria que tem sido
referência para o Brasil. E eu estou permanentemente ampliando: agora estão
sendo capacitados mais 1.150 policiais, que deverão ingressar até junho. Aqui
acolá, ajo como uma pessoa normal. Fui à praia domingo, e vi em cinco ou seis
pontos a presença da polícia na rua, que amplia muito a sensação de segurança e
afasta os marginais. Ações houve, ações continuam havendo e ações estão sendo
implantadas. Nos próximos dez dias, vamos fazer um ato formal de pagamento aos
profissionais pelos resultados alcançados na área. Reservamos R$ 120 milhões
por ano, que não é pouca coisa.
OP - O senhor sai do Governo, então,
com a consciência tranquila?
CG - Não tenho
sentimento de frustração nenhum. Se tivesse largado o governo agora, sairia com
a consciência tranquila.
OP - Mesmo com os resultados obtidos?
CG - Eu acompanho,
não estou isolado do mundo, não. O governo tem 70% de aprovação.
OP - Mas há uma queixa recorrente da
população nessa questão da segurança.
CG - Sim, mas mesmo
quem se queixa, qualquer pessoa de bom senso haverá de reconhecer o esforço que
tem sido feito, salvo por uma questão politica. É indelicado se falar de outros
lugares, mas uma vez eu estava em reunião com outros estados que vão ser sede
da Copa do Mundo e ponderei: estou precisando de uma ajuda nessa coisa de
droga, que, a meu juízo, é o grande responsável, pois 80% dos homicídios estão
relacionados a ele. Todos os homicídios que envolvem pessoas que não estão no
mundo do tráfico, como regra, são elucidados muito rapidamente. Não é
deficiência total, não é falência total do sistema de segurança. O sistema
consegue identificar e prender os autores desses crimes que não tem relação com
o tráfico. Boa parte desses latrocínios, o padre (Elvis Marcelino de Lima,
morto em julho de 2013 na Praia de Iracema), o universitário (Mardônio Freire,
de 19 anos, assassinado durante tentativa de assalto no Bairro Henrique Jorge,
em março de 2014)... Os crimes de grande repercussão são identificados autoria,
ou você me diz diferente?
OP - O problema é que não existem só
crimes de grande repercussão...
CG - É isso que eu
estou dizendo, nesses, se acaba identificando a autoria. Os outros têm a
relação com drogas, que é uma coisa recente. Para esse tipo de crime, estou
pedindo ajuda federal. Na inteligência, na identificação. Até porque isso chega
aqui, não é (originalmente) daqui. Tem a ver com fronteiras, tem a ver com o
papel da Polícia Federal. Eu tenho consciência de que fiz o que prometi. E vou
continuar tentando. Não desisto. Vou continuar tentando até a última hora.
OP - O senhor está a apenas oito meses
de encerrar seu governo. Que imagem acha que o cearense terá da sua gestão?
Como acha que será lembrado no futuro?
CG - (Nessa hora, Cid
dá uma pausa e respira fundo, com um sorriso desconcertado). Pergunta
difícil... Primeiro, a de um governador bem intencionado. Eu acho que tem
princípios, características, que são a base pra qualquer coisa: honestidade e
boa intenção. Se eu for reconhecido como um governador honesto, sério e bem
intencionado, estarei mais que satisfeito. Agora... (outra pausa). Eu sou
engenheiro, e sempre me preocupei em deixar um legado físico aqui.
OP - O senhor teme que fique marcado
pela pecha da violência?
CG - (Cid volta a
pausar para formular a reposta). Veja bem... Se você fechou o leito de um
hospital, você foi o responsável por fechar um leito hospitalar. Nessa área, eu
dobrei. Vou deixar o Ceará com mais de duas vezes a quantidade de leitos
públicos do que quando assumi. Se você fecha uma escola, você sai com essa
omissão. Nessa área, o Ceará saiu do 11º lugar do Norte e Nordeste para o 1º
lugar. Se você fecha empregos, você pega essa pecha. No meu governo,
praticamente teremos dobrado a quantidade de cearenses trabalhando com carteira
assinada. Agora, segurança... Não é uma questão que dependa unicamente de
governo, como as outras são. O Estado não é o agente homicida. Tem um setor da
sociedade doente. Tudo o que depende unicamente do governo esse governo meio
que dobrou. É um governo que equivale a cinco anteriores, somados. Segurança...
Bom, vou continuar tentando.
Fonte: Sobral em Revista.