Brasil
247 - Paulo Nogueira, editor do
Diário do Centro do Mundo, exalta a postura do ex-presidente Lula, que
reconheceu o papel da internet como campo de pluralidade e diversidade de
opiniões; no entanto, ele diz que ainda há grandes distorções no Brasil, como a
concentração de publicidade na Globo, a despeito da sua queda contínua de
audiência "Quanto maior o dinheiro colocado na internet, menor o poder de
mídias tradicionais que têm sido, ao longo dos tempos, um obstáculo formidável
para o avanço social do Brasil. Elogiá-la, como fez Lula, é um bom começo. Mas
há que fazer mais que falar", diz ele.
O
jornalista Paulo Nogueira, ex-diretor dos grupos Abril e Globo, entrou na
discussão sobre a concentração da publicidade em meios de comunicação que
enfrentam quedas agudas de audiência – como é o caso da Globo. Nogueira elogiou
a postura do ex-presidente Lula, que reconheceu a força da internet, mas cobrou
mais ações do que palavras. Leia abaixo:
Paulo Nogueira, do Diário do
Centro do Mundo
Em sua conta
no Facebook, Lula fez esta semana o elogio da “fantástica” internet. Colocou-a,
com razão, como uma alternativa à voz única, e altamente conservadora, que
domina a mídia tradicional.
O real
debate em torno das coisas do Brasil se trava hoje na internet, um território
florescente que não é e nem jamais será dominado por um pequeno grupo de
famílias interessadas na manutenção de privilégios velhos como o bigode de Rio
Branco.
Reclamar
apenas da mídia tradicional não resolve nada, disse Lula. Ele está
absolutamente certo, é verdade. Lamúrias não mudam coisa nenhuma. Mas discurso
sem ação também não.
Lula se
dirigia especificamente aos petistas, mas sua mensagem vale para todo
brasileiro cansado do conteúdo enviesado e frequentemente desonesto que domina
a mídia tradicional.
Mas.
Mas o
que concretamente tem sido feito pelo Estado para estimular a – falemos
genericamente – “voz alternativa” digital, tão importante para a sociedade?
A “velha
voz” goza de ancestrais regalias copiosas. Exemplo: não incide imposto sobre o
papel usado para imprimir jornais e revistas. É o chamado “papel imune”. Outro
exemplo: as empresas desfrutam de uma reserva de mercado abjeta – algo que elas
condenam em todo outro setor que não seja o delas mesmas. Isso impede a concorrência
estrangeira, e configura uma pancada no capitalismo puro pelo qual elas, aspas,
se batem tanto.
A lista
de mamatas vai muito além. Na publicidade oficial, as grandes corporações se
dão muito bem. Nos últimos dez anos, sob o PT portanto, a Globo levou cerca de
6 bilhões de reais, de acordo com dados divulgados pelo Secom, o órgão do
governo que administra a propaganda oficial.
A Globo
continua a receber publicidade do governo em doses torrenciais mesmo com o
declínio contínuo de sua audiência. Não é só uma anomalia governamental, é
certo. Outros anunciantes fazem exatamente o mesmo. Em 2012, a Globo nunca teve
uma audiência tão baixa e, ao mesmo tempo, nunca faturou tanto em publicidade.
São duas
coisas excludentes – queda de público e aumento de receita publicitária. Mas a
Globo opera uma mágica. Essa mágica na verdade é uma propina legalizada chamada
BV: a Globo paga uma comissão às agências que anunciam nela.
Quanto
mais a agência anuncia, mais ganha. Muitas agências, hoje, dependem do BV pago
pela Globo. E então fazem de tudo para colocar a verba de seus clientes na
emissora. Isso explica fenômenos como o seguinte: há dez anos, o Jornal
Nacional tinha audiência média de 32%, e o preço do comercial de 30 segundos
era de 200 000 reais. Agora, a audiência é 35% menor, e o comercial custa 90%
mais.
Como os
anunciantes aceitam isso é um caso de estudo. Até alguns anos atrás, com ibopes
de 50% ou mais, estar fora da Globo podia atrapalhar seriamente uma marca. Não
mais. No mundo moderno, o que pode comprometer o futuro de uma marca é não ter
presença na internet, porque os consumidores estão cada vez mais lá, na
internet, e não na Globo.
Como
tudo isso se reflete na política de anúncios do governo? No ano passado, a
fatia da internet girou em torno de 5% — um número altamente conservador quando
se consideram as circunstâncias. Se Lula tem razão ao chamar de “fantástica” a
internet, e ver nela um contraponto ao conservadorismo da mídia tradicional, é
uma porcentagem que não faz sentido.
Que
correções estão sendo feitas? É uma questão relevante para o futuro do país.
Quanto maior o dinheiro colocado na internet, menor o poder de mídias
tradicionais que têm sido, ao longo dos tempos, um obstáculo formidável para o
avanço social do Brasil. Elogiá-la, como fez Lula, é um bom começo. Mas há que
fazer mais que falar — em nome da pluralidade de ideias que deve abastecer,
democraticamente, a sociedade brasileira.
Fonte: Brasil 247.